O Observatório do Clima (OC) ‒ rede que reúne 37 entidades
da sociedade civil com o objetivo de discutir as mudanças climáticas no
contexto brasileiro ‒ lança hoje uma proposta que demonstra como o
Brasil pode chegar a 2030 limitando suas emissões de GEE (Gases de
Efeito Estufa) a 1 bilhão de toneladas de gás carbônico equivalente. O
documento sugere, no longo prazo, a neutralidade das emissões do Brasil e
dos demais países em 2050, reduzindo consideravelmente o risco que o
aquecimento global representa para o planeta.
O documento divulgado está sendo chamado de INDC da
sociedade civil. As INDCs — sigla em inglês para Contribuições
Nacionalmente Determinadas Pretendidas — consistem em metas que todos os
países deverão apresentar até 1º de outubro deste ano para o novo
acordo a ser assinado na 21ª Conferência do Clima das Nações Unidas, que
acontecerá em Paris no mês de dezembro.
Saiba mais:
O governo brasileiro ainda não indicou as bases da INDC que
levará para a reunião da França. O pacto internacional que será fechado
lá almeja que o aumento da temperatura global não ultrapasse 2ºC —
consenso científico e político entre os governos mundiais de limite
máximo para evitar mudanças catastróficas.
Mesmo com todas as projeções de crescimento do PIB do
Brasil, da população, da produção industrial e agropecuária, o número
indicado para as emissões do país em 2030 significa uma redução de 35%
do total estimado em 2010, marco da implementação da Política Nacional
de Mudanças Climáticas no país.
O Brasil é um dos dez maiores emissores de CO2 do planeta.
E, devido ao desmatamento descontrolado da última metade do século 20,
contribuiu significativamente para o aumento verificado da temperatura
global. Ao contrário do que ocorreu em outros países poluidores, a maior
parte das emissões históricas do Brasil, causadas pela destruição da
Amazônia, não gerou desenvolvimento. Um elemento-chave de proposta da
sociedade civil para 2030 é que o país zere a perda de vegetação nativa.
Especialistas do Observatório do Clima discutiram várias
opções de desenvolvimento de baixo carbono. “A sociedade civil está se
antecipando ao governo, que ainda não apresentou as metas”, afirma
Carlos Rittl, secretário-executivo do OC. Segundo ele, a proposição
lançada pelo Observatório é plenamente realizável, pois conta com
tecnologias disponíveis e em ampla utilização aqui.
Simultaneamente à INDC, está sendo apresentada uma nota
técnica com medidas voltadas aos diferentes setores da economia.
“Estamos mostrando que é possível para o país dar uma contribuição justa
e ambiciosa, que seja ao mesmo tempo boa para o clima, reduzindo
riscos, e boa para a economia, trazendo oportunidades em setores nos
quais o Brasil já tem vantagens comparativas”, diz Rittl.
Crescimento responsável
Na prática, os especialistas criaram um caminho das pedras
para uma economia de baixo carbono, demonstrando o conjunto de ações de
adaptação às mudanças climáticas para os próximos anos, com base na
realidade nacional. “Queremos assegurar à Presidente Dilma Rousseff que
ela pode assumir essa meta para a redução de emissões porque temos
condições de implementá-la. Pode ser o empurrão de que precisamos para
formalizarmos um acordo global de clima que garanta não ultrapassarmos
os 2oC de aumento de temperatura global”, salienta Tasso Azevedo,
coordenador do SEEG, o Sistema de Estimativas de Emissões de Gases de
Efeito Estufa do OC.
No setor elétrico, está em pauta congelar a expansão de
fontes térmicas de energia fóssil. Por isso, as principais providências
estão relacionadas ao aumento de energia solar fotovoltaica distribuída,
energia de biomassa (queima de bagaço de cana em termelétricas) e
energia eólica, garantindo segurança energética em períodos de baixo
nível de água em reservatórios de usinas hidrelétricas que fazem parte
do Sistema Interligado Nacional. “Se o Brasil decidir olhar para sua
vocação e potencial naturais, que são as energias renováveis como a
solar e a eólica, vai mostrar que está disposto a fazer sua parte no que
diz respeito à eletricidade”, afirma Ricardo Baitelo, coordenador da
campanha de Clima e Energia do Greenpeace Brasil.
Pastos e veículos otimizados
Na área de transportes, as proposições se baseiam no que já
está previsto na Política Nacional de Mobilidade Urbana, lei de 2012
que preconiza a ampliação da oferta de transporte público de passageiros
e o estímulo para que as pessoas troquem o transporte individual pelo
coletivo ou pelo não motorizado.
Focando em combustíveis, prevê-se o abandono gradual do uso
de óleo diesel em ônibus urbanos nas regiões metropolitanas, em favor
da eletricidade, bem como a adoção de fontes de energia mais limpas nos
automóveis (prevalência de etanol e baterias). O plano é retomar o
programa do álcool combustível para haver 80 bilhões de litros
disponíveis e rodando na frota em 2030. “É uma meta ambiciosa, mas
viável, se houver decisão política”, afirma André Ferreira,
diretor-presidente do Instituto de Energia e Meio Ambiente (Iema),
responsável pelos cálculos nesse quesito.
Quanto ao transporte rodoviário de carga, sugere-se
aumentar a mistura de biodiesel no diesel de petróleo para 20%, o
chamado B20, além de adaptação da frota às melhores práticas
internacionais (caminhões e carros de melhor desempenho e menos
poluentes).
Na agropecuária, para fazer frente ao crescimento do
rebanho, projetado para mais de 260 milhões de cabeças, será necessário
recuperar 18 milhões de hectares de pastagens degradadas e implementar
3,5 milhões de hectares de integração lavoura-pecuária-floresta. Outras
medidas que reduzirão as emissões do rebanho bovino são: o aumento da
qualidade das pastagens, a suplementação animal e a redução da idade de
abate. O volume de tratamento de dejetos de animais também precisa
dobrar. “Devemos aumentar a eficiência, sobretudo da pecuária de corte, o
que traz ganhos para o produtor”, explica Marina Piatto, do Imaflora,
que produziu as estimativas desse setor.
A expansão das áreas de lavoura, estimada em mais de 20
milhões de hectares, requererá que 70% da área de produção de grãos (83
milhões de hectares em 2030) adote o sistema de plantio direto e
priorize o uso de variedades que realizam a fixação biológica de
nitrogênio.
Etapas de evolução
Todos esses parâmetros para as políticas públicas devem
estar relacionados no Plano Nacional de Adaptação às Mudanças do Clima,
que os pesquisadores preveem que fique pronto até 2016. Ele consistirá
num conjunto de metas para redução dos impactos sobre as populações e
ecossistemas mais vulneráveis, incorporando planos de desenvolvimento e o
conhecimento científico mais recente para abordar as características
das diferentes regiões e dos setores econômicos.
O texto da INDC também indica que a redução sistemática e
anual das emissões ocorrerá a partir de 1º de janeiro de 2021. Daí em
diante, elas ficam cada vez mais limitadas ao longo de dois períodos de
cinco anos, até que, em 2030, a emissão de GEE atinja a meta de máxima
de 1 bilhão de toneladas de gás carbônico equivalente.
Em termos de viabilização financeira, os governos terão de
assegurar que, até 2020, todos os seus planos plurianuais e orçamentos
federais anuais já incluam recursos claros para financiamento das ações
necessárias à consecução da INDC.
Sobre o Observatório do Clima
Rede de entidades da sociedade civil que objetiva discutir a
questão das mudanças climáticas no contexto brasileiro. Promove
encontros com especialistas na área, além de articular os atores sociais
para que o governo brasileiro assuma compromissos e crie políticas
públicas efetivas em favor da mitigação e da adaptação do Brasil em
relação à mudança do clima.
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