Sentença da Justiça Federal de Itaituba determina que o governo federal
está proibido de licenciar a usina São Luiz do Tapajós, que afeta o povo
Munduruku, sem antes realizar a consulta prévia prevista na Convenção
169 da OIT
Menino Munduruku durante capacitação sobre Consulta Prévia realizada em 2014, no Alto Tapajós (©Greenpeace/Fábio Nascimento)
Uma boa notícia para o fim de tarde dessa terça-feira, 16 de junho: a
Justiça Federal de Itaituba proibiu o governo federal de licenciar a
usina hidrelétrica de São Luiz do Tapajós, na Amazônia paraense, sem
realizar – antes – a consulta prévia, livre e informada prevista na
Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), da qual o
Brasil é signatário.
A sentença do juiz Ilan Presser determina
que a consulta seja realizada – não apenas com indígenas, mas também
com ribeirinhos – antes da emissão de qualquer licença ao
empreendimento. “Essa decisão da Justiça é uma vitória dos Munduruku na
luta pela garantia do direito à consulta prévia”, afirma Danicley de
Aguiar, da Campanha da Amazônia do Greenpeace. “E é ainda mais
importante por reconhecer também os direitos dos povos ribeirinhos que
habitam a região, mas que estão sendo totalmente ignorados pelo
governo”, completa ele.
A Convenção 169 estabelece o direito dos povos tradicionais a serem
consultados antes de serem tomadas decisões que possam afetar suas vidas
e pretende reservar a eles o direito de influenciar o processo de
tomada de decisões que lhes afetem, como é o caso do complexo de
hidrelétricas previsto no rio Tapajós, que pode alagar territórios
indígenas e ribeirinhos, se construído.
No entanto, ela vem sendo historicamente desrespeitada pelo governo
brasileiro, principalmente quando se trata de projetos de hidrelétricas.
Para citar exemplos recentes, as populações atingidas pela construção
das hidrelétricas de Jirau e Santo Antônio (rio Madeira), ou Belo Monte
(rio Xingu), nunca foram devidamente consultadas.
Essa mesma violação do direito de consulta por parte do Estado
brasileiro já estava acontecendo no Tapajós, e é isso que a decisão,
agora, poderá impedir. O próprio juiz Ilan Presser expressou essa
preocupação na sentença: “Em todo o procedimento de licenciamento ainda
não foi observado materialmente o direito de consulta prévia. Ou seja,
da leitura dos autos verifica-se que os réus estão suprimindo direitos
de minorias, materializados na consulta. Ou, na melhor das hipóteses,
estão invertendo, indevidamente, as fases do licenciamento. ”, escreveu
ele.
O Protocolo de Consulta Munduruku
Em 2014, diversas organizações, entre elas o Greenpeace, se uniram, a
convite dos Munduruku e sob a coordenação do Ministério Público Federal
do Pará, para promover o diálogo “Consulta prévia, livre e bem informada: um direito dos povos indígenas e comunidades tradicionais da Amazônia”,
realizando oficinas sobre a Convenção 169 envolvendo lideranças
ribeirinhas e do povo Munduruku, que vivem às margens do Tapajós. O
objetivo era que, cientes de seus direitos, eles pudessem obter as
ferramentas necessárias para saber como reivindica-los.
O encontro deu resultado. Ainda em 2014 os Munduruku e os ribeirinhos
criaram protocolos de consulta em que definiram como querem ser
consultados em relação a construção de hidrelétricas no rio Tapajós e
também a outras obras que possam ter impacto em suas vidas e seus
territórios. Em fevereiro desse ano, uma delegação Munduruku esteve em
Brasília para entregar o seu Protocolo nas mãos do ministro da
Secretaria-Geral da Presidência da República, Miguel Rossetto, que se
comprometeu a analisar. Até hoje, no entanto, o governo sequer deu
resposta.
Entre várias diretrizes, o Protocolo Munduruku decide que o processo
de consulta deve ocorrer em todas as aldeias, para consultar todo o
povo, e não apenas as lideranças. Além disso, os Munduruku definiram que
não irão aceitar a presença de policiais armados durante as reuniões de
consulta, não aceitarão ser removidos de seus territórios e que a
consulta só deve ocorrer após o avanço no procedimento de demarcação da Terra Indígena Sawré Muybu, que corre o risco de ser alagada caso as usinas sejam construídas.
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