A Agenda Brasil, plano de recuperação econômica divulgado hoje pelo
Governo Federal, é uma proposta que destroi o Brasil antes de salvá-lo.
Conjunto de ONGs lança manifesto rechaçando medidas.
Lançada hoje (11/8) pelo Governo Federal e senadores da base aliada, a Agenda Brasil
é um pacote de 28 medidas para combater a crise. No entanto, a
iniciativa acaba por revelar a incapacidade do governo de formular um
plano nacional que enxergue o meio ambiente, não como entrave, mas como
alavanca para desenvolver e modernizar o Brasil.
O plano embutido na Agenda Brasil é fazer mais do mesmo. O
meio ambiente à reboque da economia e a inclusão social, do aumento do
consumo e não pela garantia dos direitos básicos aos cidadãos. Em reação
ao documento, conjunto de organizações da sociedade civil, entre elas o
Greenpeace, divulgou manifesto rechaçando as medidas apresentadas.
O governo federal mais uma vez perde a chance de fazer
diferente. Mostra não conseguir enxergar oportunidades na crise. Ao
invés de repensar os rumos do País, continua com a implantação de
programas emergenciais, que são desenhados no atropelo, porém que
definem as condições de vida da sociedade por muitas décadas. É a lógica
de empurrar o problema com a barriga, adotando medidas com impacto
negativo na população e no meio ambiente.
Já passou da hora de pensar um modelo de desenvolvimento
que respeito a diversidade socioambiental do Brasil, levando em conta os
mais diversos recursos que o País dispõe. É o momento de mostrar que a
floresta em pé é mais valiosa que a floresta no chão; é a hora do desmatamento zero.
É o momento de reconhecer que quem mora longe dos centros urbanos
também é cidadão brasileiro e de entender que, quando a água da torneira
seca em casa, é por que a mata ciliar que protege rios e a floresta
foram destruídas. É impossível salvar o Brasil destruindo o Brasil.
Pontos críticos
Dividida em três áreas, “Melhoria do Ambiente de Negócios e
Infraestrutura”, “Equilíbrio Fiscal” e “Proteção Social”, a Agenda
Brasil contém diversos pontos críticos em relação ao meio ambiente, que
segue sendo visto pelo governo e pelo setor privado como um empecilho
para o desenvolvimento brasileiro.
As terras indígenas são colocadas dessa maneira, como
entraves para a recuperação da crise, e propõe-se a revisão dos marcos
jurídicos que as regulam para acelerar as obras de infraestrutura. A
proposta tem o claro objetivo de transformar essas terras em locais de
atividades produtivas, ou seja, torná-las rentáveis aos olhos da União.
Não se leva em conta, como de costume, os povos tradicionais que alí
habitam, suas culturas e hábitos, e muito menos os serviços prestados
por estes territórios preservados, como a regulação climática, a
produção de chuvas e a manutenção da biodiversidade, entre outros.
A proposta também quer incentivar a mineração a partir da
implementação de um novo marco jurídico para o setor. Isso vai gerar uma
corrida, sem regra conhecida e com potencial dramático de destruição,
às riquezas que hoje pertencem à União.
Outro ponto de atenção é que a Agenda Brasil estipula a
revisão da legislação de licenciamento ambiental em zonas costeiras,
áreas naturais protegidas, unidades de conservação e cidades históricas.
Além disso, pede por uma “PEC das Obras Estruturantes”, pela qual os
processos de licenciamento ambiental referentes às obras do PAC
(Programa de Aceleração do Crescimento) e dos programas de concessões
seriam simplificados.
Enquanto a Agenda Brasil tenta enfraquecer o processo de
licenciamento ambiental, a presidente discursa apresentando o Programa
de Investimento em Energia Elétrica, enaltecendo os esforços do governo
no que tange ao licenciamento. O problema é que a própria diz que “as
hidrelétricas foram feitas com cuidado e rapidez” e, quando olhamos para
a realidade, especialmente para as usinas do Rio Madeira e para Belo
Monte,no Xingu, vemos no que ‘rapidez’ se traduz: impactos
socioambientais graves e irreversíveis, sentidos principalmente pela
população mais pobre.
A marcha da insensatez agora avança sobre o Rio Tapajós, no
Pará, com o governo tentando empurrar goela abaixo de comunidades
ribeirinhas e povos indígenas a construção da hidrelétrica de São Luiz
do Tapajós.
O Procurador do Ministério Público Federal, João Akira, em artigo publicado na mais recente edição da Revista Greenpeace,
pontua que os problemas do licenciamento ambiental são de outra
natureza e não dizem respeito à velocidade da marcha procedimental, mas à
sua qualidade e à decisão política de investimento na sua eficácia. “O
que se verifica não são essencialmente falhas normativas, mas défice
democrático e deficiências na condução dos procedimentos, o que tornam
injustificáveis muitas das decisões tomadas. O exercício do poder
político e a expansão do poder econômico já não se satisfazem com o
sacrifício dos há muito sacrificados, agora querem que seja feito tudo
muito rápido”, afirmou Akira.
Acelerar o licenciamento destes projetos tende a expor a
população aos risco do planejamento ruim, abre a porta para a ja
endêmica indústria de corrupção comum as estas obras. Taí a Lava-Jato
com uma cachoeira de exemplos lamentáveis. Estes grandes projetos, como
as hidrelétricas na Amazônia, são sempre acompanhados de grandes
impactos ambientais – muitos deles irreversíveis. São obras que atingem
áreas de preservação permanente, derramam óleo no mar, que contaminam e
represam os rios, deslocam milhares de pessoas e contribuem para o
desmatamento.
Público ou privado?
Como se não bastasse, o pacote de medidas ainda pede a
revisão do marco regulatório das concessões, para favorecer os
investimentos privados em projetos de infraestrutura. São aqueles
projetos de uso público e comum que o Estado transfere a execução para o
setor privado. Ou seja, são todos aqueles projetos que deveriam atender
à população brasileira e não à lógica econômica financeira. Isso está
diretamente ligado com outro ponto da tal “agenda”, que pede a
implantação de uma "Avaliação de Impacto Regulatório", para que o Senado
possa dimensionar as consequências das normas dessas concessões nos
investimentos em infraestrutura. O que se esquece, uma vez mais, é que
seria necessário avaliar o impacto também na vida das pessoas.
Em resumo, a Agenda Brasil mais uma vez se fortalece o
discurso de enfraquecer o princípio da precaução, das salvaguardas
ambientais e os direitos coletivos. Enfraquece sobretudo uma alternativa
para o desenvolvimento do Brasil que concilie produção e preservação,
desenvolvimento com transparência e respeito aos recursos naturais,
econômicos e humanos. Por tudo isso, com a Agenda Brasil o governo
reenforça sua torpe miopia.
Crédito da foto de capa: © Marcos Oliveira / Agência Senado - Creative Commons
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