Índios protestam em frente ao Ministério da Justiça
(©Greenpeace/Wenderson Araújo)
A Praça dos Três Poderes e a Esplanada dos Ministérios foram palco, ontem, de demonstrações de desrespeito aos direitos dos povos indígenas. Ao tentar se manifestar contra a PEC 215, indígenas e representantes da sociedade civil foram impedidos de entrar no Congresso e sofreram forte repressão policial. Alguns chegaram a ser presos de maneira arbitrária. Diante de tanta indignação, a Articulação de Povos Indígenas do Brasil escreveu uma carta em que denuncia as violações sofridas ontem, além de destacar que os direitos indígenas vêm sido sucessivamente atacados pelo Estado e seus representantes, ao contrário do que determina a Constituição.
Entenda o que está em jogo na PEC 215 e porque os ruralistas têm tanto interesse em aprová-la. Você também pode ajudar enviando um e-mail diretamente ao presidente da Câmara, solicitando a rejeição da proposta.
Denúncia contra a supressão de direitos e as tentativas de acabar com os povos indígenas do Brasil
Nós, lideranças de povos e organizações indígenas de todas as regiões
do Brasil, reunidos em Brasília-DF, para manifestar o nosso repúdio ao
processo de supressão dos nossos direitos fundamentais, coletivos e
originários, operado ostensivamente, por distintas instituições do
Estado Brasileiro, notadamente pelo Congresso da República, sob olhar
omisso e conivente do Poder Executivo e setores do Poder Judiciário,
viemos junto à opinião pública nacional e internacional denunciar:- A truculenta atuação das forças policiais - Legislativa, Polícia
Militar (PM) e Força Nacional-, que além de impedir o nosso acesso ao
Congresso Nacional, considerado a casa do povo, agem contra o estado de
direito, o regime democrático, com abuso de autoridade, reprimindo,
intimidando, ameaçando e detendo arbitrariamente parentes nossos, como
aconteceu na última terça-feira, 16 de dezembro, quando a PM capturou no
acesso principal do Ministério da Justiça quatro lideranças e outras
duas na BR-040 quando de noite voltávamos ao espaço onde nos alojávamos.
- A bancada ruralista, na sua maioria herdeiros dos invasores do
território hoje chamado Brasil e dos algozes dos nossos povos no período
da ditadura, quer de todas as formas suprimir os nossos direitos
assegurados pela Constituição Federal de 1988, legalizando a usurpação, o
esbulho e a espoliação que secularmente vem praticando contra as poucas
terras que nos restaram nesses 514 anos de invasão.
- Os ruralistas, muitos deles financiados pelas corporações do
agronegócio, frigoríficos, indústria armamentista e empreiteiras, entre
outros, a partir de 2011, principalmente, têm feito de tudo para
modificar, conforme seus interesses, o texto constitucional que garante
os nossos direitos, por meio de iniciativas legislativas como a Proposta
de Emenda Constitucional - PEC 215 de 2000, o PL sem número proposto
pelo senador Romero Jucá que altera o Artigo 231, parágrafo sexto, a PEC
237 que trata do arrendamento das terras indígenas e o Projeto de Lei
Complementar 227, que tem o mesmo propósito do PL do dito senador.
- O governo da Presidente Dilma, mesmo tendo se declarado contrário à
PEC 215, pouco tem feito para conter esta temerosa ofensiva, que no
atual momento se configura como um plano genocida, de extermínio dos
nossos povos, pois com seu peculiar silêncio mostra concordar que os
nossos direitos territoriais sejam suprimidos, apesar de que na “Carta
aos Povos Indígenas do Brasil”, publicada pela então candidata nas
últimas eleições, tenha afirmado trabalhar visando “novos avanços,
particularmente na demarcação das terras indígenas, dentro dos marcos da
nossa Constituição”.
- Declarações dessa natureza se tornam vazias quando o governo se
omite de orientar a sua bancada de sustentação para conter os ataques
sistemáticos aos direitos indígenas no Congresso Nacional e quando toma a
determinação de suspender o processo de demarcação das terras
indígenas, pois assim parece concordar com os objetivos dos ruralistas
de invadir, explorar e mercantilizar os nossos territórios e suas
riquezas, para o qual querem interferir nos processos de demarcação,
reabrir processos concluídos e parar totalmente os processos de
demarcação.
Jamais a presidente Dilma diria para os povos indígenas o que falou para a Confederação Nacional da Agricultura (CNA), na posse de sua presidente senadora Kátia Abreu: "Quero a CNA ao meu lado... Proponho mais que isso. Quero o produtor rural tomando decisões junto comigo, participando do governo e atuando diretamente na definição de novas políticas". Isso para uma entidade que considera os povos indígenas e quilombolas empecilhos ao “desenvolvimento”. - Diante deste quadro de ameaças e ataques, reafirmamos a nossa determinação de continuar em luta para defender os nossos direitos, para o qual esperamos contar com o apoio de outros movimentos e organizações sociais e da opinião pública nacional e internacional, exigindo do Estado brasileiro a efetivação das seguintes reivindicações:
- Demarcação de terras indígenas, com dotação orçamentária necessária. Há um passivo de mais de 60% de áreas não demarcadas.
- Proteção, fiscalização e desintrusão das terras indígenas, assegurando condições de sustentabilidade aos nossos povos.
- Inviabilizar iniciativas legislativas (PECs, PLs) que buscam
suprimir os direitos indígenas assegurados pela Constituição Federal,
em favor de uma agenda positiva.
- Aprovação do projeto de lei e efetivação do Conselho Nacional de
Política Indigenista, instância deliberativa, normativa e articuladora
de políticas e ações atualmente dispersas nos distintos órgãos de
governo.
- Aplicação da Convenção 169 sobre Povos Indígenas e Tribais em Países
Independentes da Organização Internacional do Trabalho (OIT), em todos os assuntos de nosso interesse.
- Implementação efetiva do Subsistema de Saúde Indígena, através do fortalecimento da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) para superar o atual quadro de caos e abandono.
- Garantia de acesso à educação de qualidade, específica e diferenciada, nas aldeias, na terra indígena ou próxima a ela.
- Garantir a participação de indígenas no Conselho Nacional de
Incentivo à Cultura e a criação de instância específica para atender as
demandas das nossas culturas.
- Compromisso com o fim da criminalização, o assassinato e a prisão arbitrária de lideranças indígenas que lutam pela defesa dos direitos territoriais de seus povos. Nesse sentido exigimos a imediata soltura das nossas lideranças que foram presas, no dia de ontem, apenas por se manifestarem contra a inconstitucional PEC 215.
Mobilização Indígena Nacional
Brasília – DF, 17 de dezembro de 2014.
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