Sonho antigo dos ruralistas, mudança à Constituição que acaba com os
direitos dos índios no Brasil foi aprovado em Comissão da Câmara
dominada pela bancada símbolo do retrocesso
Deputados em favor dos direitos indígenas deixam sessão
antes do início da votação para deslegitimar o processo. (© Gustavo Lima
/ Agência Câmara)
Segundo o texto, que recebeu alterações de última hora, o reconhecimento e homologação desses territórios passarão a ser feitos por lei de iniciativa do Executivo ao invés de decreto. Com isso, a palavra final ficaria a cargo do Congresso Nacional ou, em outras palavras, nas mãos da bancada ruralista. Assim, novas demarcações ficariam inviabilizadas, além de colocar em risco muitas das que já existem. Não é à toa que os indígenas a chamam de PEC do Genocídio.
“Quando essa Comissão foi criada, achei que era com o objetivo de ser uma Comissão de negociação. Mas na verdade era uma Comissão de imposição e perdemos as esperanças de qualquer tipo de conciliação”, disse o deputado Sarney Filho (PV/MA) e defendeu, exaltado: “Se amanhã tivermos mortes, se amanhã tivermos uma revolução indígena, a culpa vai ser dos senhores”.
O deputado Alessandro Molon (Rede/RJ) foi o último a
defender os direitos indígenas antes de um protesto organizado pelos
deputados desfavoráveis à proposta: “A história do Brasil é a história
da opressão e do massacre dos que estavam aqui antes. E nós não queremos
ver mais mortes. Não vamos votar para não legitimar esse processo.
Vamos nos retirar, e que o senhor registre em ata. [A PEC 215] Vai
provocar um banho de sangue no campo brasileiro”.
Indígenas ficaram do lado de fora cantando e mostrando cartazes (© Alan Azevedo / Greenpeace)
“Na floresta, os índios são constantemente amaçados por madeireiros, pela invasão do agronegócio, pelas queimadas,
pelo garimpo, pela grilagem... Mas são nas salas refrigeradas de
Brasília que está sendo confeccionado o exterminio em massa dessas
populações. Ao negar os direitos indígenas os deputados da bancada
ruralista, sob a falsa alegação de representarem quem produz comida
nesse país, promovem o que existe de mais atrasado e preconceituoso na
política nacional”, defende Danicley de Aguiar, da campanha da Amazônia
do Greenpeace.
Alterações no texto
Ao longo da sessão, parlamentares contra e favor da proposta criaram
um debate tenso, principalmente porque o texto havia sido modificado
mais cedo, na mesma manhã, após reunião pela manhã com o ministro da
Justiça José Eduardo Cardozo e Fundação Nacional do Índio (Funai).
Segundo o relator Osmar Serraglio (PMDB/SC), a principal
mudança prevê uma tramitação semelhante à de uma Medida Provisória, que é
um Projeto de Lei de iniciativa do Executivo e deve ser votado pelo
Congresso Nacional. Serraglio anunciou também a criação de uma vaga de
Deputado Federal que representaria os interesses dos índios – isso
frente a cerca de 200 cadeiras controladas pelos ruralistas.
Além dos novos pontos, vale lembrar que o texto também
proíbe a ampliação de territórios indígenas já demarcados, estabelece o
direito de indenização aos proprietários de terra e estabelece o dia 5
de outubro de 1988, data da promulgação da Constituinte, como marco
temporal para definir o que são terras tradicionalmente ocupadas por
indígenas e quilombolas.
A PEC 215 é de 2000, ou seja, tramita há 15 anos na Casa.
Agora ela segue para votação do Plenário da Câmara dos Deputados. Em
seguida ela vai para apreciação do Senado, que já se manifestou
contrariamente à emenda em um manifesto assinado por 48 senadores.
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