A Conferência do Clima da ONU começou agitada pelas manifestações da sociedade e pela presença de chefes de estado. Esfriou com o passar dos dias e as negociações entre países desenvolvidos e em desenvolvimento, que discutem a responsabilização pelas mudanças climáticas e os prazos das metas


Balão do Greenpeace foi erguido ao lado da Torre Eiffel com a mensagem de que precisamos de 100% energias renováveis. (©Micha Patault/Greenpeace)

Chegamos à metade da COP21 – a importante conferência da ONU sobre mudanças climáticas, que precisa gerar um novo acordo global – com algumas notícias boas e também algumas preocupações. No final de semana que antecedeu a conferência em Paris, belas intervenções e atividades mostraram que cidadãos do mundo inteiro estão mais mobilizados do que nunca e seguirão agindo pelo clima durante e após a COP 21. Essas pessoas querem que seus governantes acompanhem o ritmo. A enorme Mobilização Mundial pelo Clima,corrente humana, os pares de sapatos, simbolizando ativistas que não puderam se manifestar em Paris, e o balão do Greenpeace próximo à Torre Eiffel (na foto acima) são apenas alguns exemplos dessa força da sociedade civil.
Seguindo o embalo dessas manifestações, os dois primeiros dias da COP 21 foram agitados. Inspirados discursos de chefes de Estado e de governos deram o tom inicial das negociações e trouxeram ambição para o futuro acordo global. Em paralelo, diversos anúncios de peso mostraram que muitos já estão se mexendo. A Índia puxou o lançamento de uma aliança pela energia solar e 120 países estão envolvidos. O compromisso de ter 100% energias renováveis até 2050 foi firmado por dezenas de nações que estão presentes em Paris. E por prefeitos também. No dia 4 de dezembro, quase mil governantes locais se comprometeram com o fim do consumo de combustíveis fósseis – como o petróleo e o carvão, principais causas das mudanças climáticas no mundo. Entre esses governos estão o do Rio de Janeiro, Londres, Fukushima, São Franciso e Lima.
A empolgação dos primeiros dias, contudo, se diluiu com o passar da semana. Negociações climáticas nunca são fáceis – não à toa, conferências acontecem há 21 anos e ainda não conseguimos chegar a um acordo global à altura do desafio. Mas esse ano, essa COP 21 precisa que ser diferente. O principal assunto que trava o debate é o da diferenciação das nações: Qual o nível de responsabilidade que os países desenvolvidos e os em desenvolvimento devem assumir em relação aos compromissos para barrar as mudanças climáticas? Como tomar essa decisão se considerarmos que os primeiros são historicamente mais culpados pelo problema e os segundos sofrerão as consequências?

A situação só fica mais complicada com o fato de nações em desenvolvimento, como China, Índia e Brasil, emitirem hoje mais de 60% dos gases de efeito estufa que geram as mudanças climáticas. Então, como garantir que esses países, pesos-pesados na economia global e na conta das emissões, assumirão responsabilidades à altura de sua capacidade de ação? Em barco afundando, não adianta discutir de quem fez o maior buraco – é preciso ação, ou todos afundarão jutos.
Além desse debate sobre diferenciação, que dificulta o progresso especialmente quando países discutem assuntos relacionados a financiamento (quem paga a conta?), também há riscos em dois temas-chave: como fazer as promessas se tornarem mais ambiciosas com o passar do tempo? E qual será a meta de longo prazo acertada globalmente?

Para a construção do acordo, todos os países foram convidados a apresentar seus compromissos nacionais, que começam a valer em 2020. Alguns querem prazos de 5 anos para esses compromissos, outros querem 10 anos. E há os que propõem uma primeira revisão já em 2018, assim elevaremos o nível de ambição antes mesmo do primeiro ciclo começar. A soma dos 158 compromissos nacionais de corte de emissões já apresentados ainda não é suficiente para conter o aquecimento global. Então, tanto uma revisão antes de 2020, quanto ciclos mais curtos (de 5 anos) são fundamentais para garantir uma ação rápida o suficiente para garantir um futuro seguro ao planeta.
Em relação à meta de longo prazo, também está em jogo em Paris um compromisso coletivo para as próximas décadas. O cenário ideal é que países se comprometam com 100% de energias renováveis ou com zero emissões de carbono (principal gás de efeito estufa) até 2050. Contudo, muitos governos preferem uma meta que aponte apenas para o final do século, ou uma meta menos concreta e mais simbólica. Ainda há opções no texto de negociação que, se escolhidas, nos colocariam nesse cenário ideal – mas não será fácil garantir que elas continuarão lá.
O governo brasileiro apresentou um compromisso nacional fraco, bem recebido pelos negociadores, mas que, na prática, significará a condenação das florestas a conviver com pelo menos 15 anos de crime ambiental, e que não aumentará o uso de energias renováveis pelo país.

Ainda assim, o Brasil tem papel fundamental nas negociações da ONU. Nosso governo defende lados positivos no acordo (como o ciclo de revisão de cinco anos e a meta de descarbonização do planeta) e faz a mediação para que conversas se desenrolem e entre outras nações. Só que nossos negociadores poderiam ser mais ambiciosos, posicionando-se firmemente a favor de uma primeira revisão dos compromissos antes de 2020, e defendendo uma meta de longo prazo para 2050 – e não para o fim do século.
Nessa segunda semana de COP 21, que começa dia 7 de dezembro, as conversas subirão de nível. Ministras e ministros de todos os países assumirão a lideranças das negociações. Se a conferência acabará com um acordo relevante ou com um fracasso, depende deles. O texto de negociação que chegará às suas mãos foi fechado no sábado, e ainda inclui opções positivas para todos os assuntos-chave – apesar de a disputa para garantir sua manutenção ser dura. Estaremos de olho, e pressionando pelo melhor acordo para todos nós.
A cada dia fica mais claro como seremos afetados pelas mudanças climáticas, e que as populações mais pobres sofrerão os maiores impactos. Também fica mais óbvio como as soluções para contermos o aquecimento do planeta beneficiarão toda a população. E os efeitos positivos vão muito além da superação das mudanças climáticas em si. Manter a situação como ela está só interessa aos poucos que lucram com isso. Por isso, sair de Paris sem um bom acordo é simplesmente inaceitável.

*Pedro Telles é da Campanha de Clima e Energia do Greenpeace Brasil