Wednesday, October 15, 2014

Crime oficial

Greenpeace publica artigo de opinião no jornal Estado de Minas sobre madeira ilegal no Brasil; quem assina o texto, publicado dia 10, é a coordenadora do Greenpeace Marina Lacorte 

Área de exploração ilegal na Amazônia paraense. Cerca de 80% de toda a área com exploração madeireira no Pará é ilegal. © Greenpeace / Lunae Parracho

O mercado da madeira nativa da Amazônia, baseado em um produto nobre, raro e bastante cobiçado, movimenta cerca de R$5 bilhões ao ano e cria milhares de empregos. Poderia ser uma alternativa de renda para a região, não fosse por um detalhe: mais da metade da produção é ilegal e está contribuindo para a destruição da floresta.
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Para ser legal, a madeira precisa ter sido extraída de um plano de manejo florestal sustentável aprovado. Trata-se de um conjunto de técnicas de extração seletiva de árvores que, quando bem feita, aumenta a rentabilidade da atividade e reduz seu impacto, agregando valor à floresta em pé e impulsionando o desenvolvimento local da região. Porém, para que este ciclo virtuoso exista e o plano de manejo seja bem executado, é necessário um sistema de controle oficial eficiente, capaz de premiar os bons empresários e punir quem coloca madeira ilegal no mercado.
Infelizmente, não é isso o que acontece hoje na Amazônia. Enquanto a madeira ilegal é extraída sem controle, os que tentam atuar dentro da lei acabam sendo castigados pela competição desleal com aqueles que trabalham de forma criminosa.
Esse problema se agravou em 2006, quando foi aprovada a “Lei de Gestão de Florestas Públicas”, que criou um novo sistema de controle –  uma espécie de “banco de créditos” de madeira – que registra movimentações entre os diversos agentes da cadeia. A lei repassou, da noite para o dia, a responsabilidade sobre gestão florestal das mãos do governo federal para os governos estaduais, que não estavam preparados para isso. O resultado de tais mudanças, após 8 anos, se mostrou desastroso.
Entre 2006 e 2012, cerca de 80% de toda a área com exploração madeireira no Pará, maior produtor e exportador de madeira nativa serrada, não contou com nenhuma autorização, ou seja, produziu madeira ilegal. No Mato Grosso, segundo maior produtor, o índice ficou em 44%. Entre 2007 e 2012, falhas primárias nos sistemas oficiais de controle do setor permitiram que fossem irregularmente comercializados 1,9 milhão de metros cúbicos de produtos florestais, volume equivalente à uma área de 64 mil campos de futebol explorada de forma criminosa.
Para ‘fechar a conta’, quase toda essa ilegalidade recebe documentação oficial do governo. Conforme o Greenpeace mostra em sua campanha, Chega de Madeira Ilegal (chegademadeirailegal.org.br), a facilidade de ‘fabricação’ de créditos de madeira sem lastro permite que toda a exploração ilegal encontre documentação oficial, pois os sistemas que deveriam impedir a madeira ilegal servem, na maioria das vezes, para “lavá-la”, dando a aparência de legalidade à uma madeira que pode ter sido extraída de áreas protegidas, como terras indígenas e unidades de conservação. Temos, desta forma, uma espécie de crime com consentimento oficial, que causa uma série de graves problemas, como a degradação, o desmatamento e inúmeros conflitos sociais. Enquanto isso, o consumidor se torna cúmplice involuntário da destruição da floresta.
A imediata revisão dos planos de manejo e de “falhas” no sistema cabe aos governos estaduais, sobretudo do Pará e do Mato Grosso. Mas uma solução duradoura também é necessária e ela pode e deve ser capitaneada pelo governo federal. Neste momento em que candidatos à Presidência discutem temas de grande relevância econômica, social e ambiental, o Greenpeace demanda uma solução para o caos madeireiro na Amazônia, antes que as oportunidades se esgotem e, com elas, a própria floresta.

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