Laís Modelli
De caça ilegal à destruição de rios que
servem como berçários para espécies de peixes, o rastro de destruição da
atividade garimpeira vai muito além do mercúrio!
A Amazônia brasileira é um dos biomas mais ricos e diversos do mundo, lar de centenas de povos e milhões de espécies, muitas delas ainda desconhecidas pela ciência. Apesar disso, o bioma vem sendo sistematicamento destruído por atividades econômicas incapazes de conviver com a floresta, como é o caso do garimpo.
Não é novidade que a atividade garimpeira vem se espalhando por toda a Amazônia, ameaçando terras indígenas e unidades de conservação – de onde saem ilegalmente toneladas de ouro e outros minerais -, assim como toda a saúde pública dos mais de 30 milhões de pessoas que habitam a região – em especial, os povos indígenas -, por meio da contaminação pelo mercúrio.
Neste 22 de maio, Dia Internacional da Biodiversidade, também não podemos nos esquecer que, não bastasse ser uma ameaça aos diversos povos da Amazônia, o garimpo também se expande à custa da morte de rios que servem de berçários para a reprodução da vida aquática em bacias importantes para a conservação do bioma amazônico.
Listamos abaixo quatro formas que mostram como o garimpo vem afetando a biodiversidade amazônica:
1- Com pistas de pouso clandestinas no meio da floresta:
Um levantamento do MapBiomas mostrou que existem 320 pistas de pouso no interior de terras indígenas sendo operadas pelos garimpeiros. Apenas dentro da terra indígena Yanomami, são 75 pistas de pouso. E para construir essas pistas, é preciso derrubar muita árvore e vegetação nativa.
2- Com a caça ilegal promovida pelos garimpeiros:
Pois é, não são somente os produtos usados pelo garimpo que destroem a biodiversidade local, mas os próprios garimpeiros, que caçam animais na floresta para se alimentarem.
Um estudo do Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) mostrou que a presença de garimpeiros afeta de maneira séria a vida silvestre ao redor dos rios. Os garimpeiros caçam indiscriminadamente macacos, pacas, cotias, tatus e capivaras, entre outros animais. Acontece que várias dessas espécies se alimentam de frutos e desempenham papéis importantes nos processos de dispersão de sementes e polinização. À medida que o tamanho de uma determinada população de animais diminui, essas funções ecológicas ficam comprometidas.
3- Pela contaminação e alteração dos ecossistemas aquáticos:
Além do mercúrio, a atividade garimpeira lança diversos outros sedimentos nos rios. Munidos de escavadeiras e sistemas hidráulicos de alta pressão (Bico Jato), os garimpos são em grande medida uma das principais fontes de sedimento para os rios da região, em especial após a introdução das escavadeiras hidráulicas, que conseguem destruir em um dia o que três garimpeiros levariam 40 dias para destruir, segundo o relatório publicado pelo Greenpeace Brasil, em parceria com o Greenpeace do leste asiático, “Parem as Máquinas: por uma Amazônia livre de garimpo”.
Esses sedimentos aumentam a turbidez, reduzindo a entrada de luz na água. Assim, peixes que dependem de luz para caçar são muito prejudicados e diversas dinâmicas de predadores e presas são modificadas. Os sedimentos também podem afetar processos respiratórios dos peixes, grudando nas brânquias (os grãos respiratórios) desses animais e interferindo nas trocas gasosas.
4- Pela localização dos garimpos, geralmente em áreas de desova de peixes:
O garimpo ilegal na Amazônia também
afeta espécies de peixes que dependem das cabeceiras de rios para seus
processos de desova, uma vez que os garimpos ocorrem majoritariamente
nesses lugares.
O que é biodiversidade, afinal?
Em
2022, o Greenpeace Brasil organizou uma expedição científica pelo rio
Manicoré, no interior do Amazonas, para estudar as espécies de uma
floresta pública até então nunca estudada. Foi a expedição A Amazônia que Precisamos.
Em uma das várias incursões pela floresta com uma equipe de botânicos, ouvimos a professora Martinha – Marta Regina, da Universidade Estadual do Amazonas (UEA) – lamentar que “o desmatamento e o garimpo estão destruindo espécies que nem tivemos a chance de conhecer ainda”, dizia.
Martinha sempre nos lembrava que ainda não conhecemos nem estudamos metade dos 5 milhões de km² da Amazônia e, por isso, ainda não é possível afirmar o quanto a Amazônia é, de fato, biodiversa. Ou melhor, megabiodiversa.
“O que sabemos é que tem mais vida embaixo da terra do que na sua superfície”, afirma a botânica, nos lembrando que os solos abrigam um mundo mágico de milhares de microrganismos, importantes para a produção de remédios, à agricultura e até à qualidade e quantidade de alimentos que consumimos. “Tem um mundo invisível sob nossos pés”, dizia Martinha.
O quanto a Amazônia é megabiodiversa? Não sabemos. O que sabemos é que precisamos parar de destruir a floresta para que pelo menos tenhamos a chance de conhecer a variedade de vida existente na Amazônia. Chega de garimpo e desmatamento, a Amazônia precisa urgentemente de um novo modelo de desenvolvimento que não seja baseado na destruição. Chega de garimpo na Amazônia.
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