Wednesday, October 14, 2020

Garimpo em Terra Indígena: quando a pós-verdade vale ouro

Danicley de Aguiar

 Em carta aberta, lideranças do povo Munduruku reafirmam que são contra mineração e garimpo no território

Fotos mostram floresta destruída pelo garimpo, com lama por toda a parte, máquinas trabalhando, rio poluído e árvores destruídas.
Sobrevoo registra destruição causada pelo avanço do garimpo ilegal dentro da Terra Indígena Munduruku, no Pará, em setembro de 2019. © Christian Braga / Greenpeace

Não bastasse a disposição do presidente em estimular e alimentar a polarização do país, que divide famílias e rompe círculos longevos de amizade, agora as táticas de pós-verdade, quando fatos são desvalorizados e boatos e crenças infundadas prosperam como verdade, são largamente utilizadas para relativizar ou reinterpretar os direitos indígenas. O objetivo? Pavimentar o acesso de mineradoras e garimpeiros ao subsolo das terras indígenas, em especial na Amazônia.

Ao longo de 2019 e 2020, expoentes da causa mineral na Amazônia, entre eles políticos e empresários, se revezaram num festival de interpretações enviesadas a respeito dos direitos indígenas previstos na Constituição de 88 e, de maneira articulada, seguem tentando garantir um aparente ar de legalidade à onda de garimpos ilegais que se estabelecerão em importantes terras indígenas da Amazônia.

Os que defendem a exploração de ouro nas terras indígenas e, consequentemente, a aprovação do PL 191/2020 (PL da Morte

), pouco ou quase nunca falam das consequências nefastas produzidas pelo avanço dos garimpos ilegais na região, fazendo de conta que o garimpo só produz riqueza e desenvolvimento. 

Sob o signo dessa tragédia, não é de hoje que o povo Munduruku se pronuncia contrário à destruição de seu território em favor do enriquecimento de um seleto grupo, os chamados Barões do Garimpo, aqueles que financiam a exploração e também compram o ouro explorado ilegalmente .

Além de vitimar a verdade, essa guerra contra os fatos tem custado caro à saúde dos mais de 12 mil Munduruku que vivem no médio e no alto curso do rio Tapajós, que seguem forçados a conviver com altos níveis de contaminação por mercúrio, bem como com a destruição de seus rios e florestas. 

Ante a enxurrada de mentiras, negação das evidências científicas, disseminação gratuita do ódio e aliciamento de uma fração menor do povo, as principais lideranças Munduruku têm sistematicamente expressado a rejeição do povo ante a onda de garimpos que se estabeleceu no interior dos territórios, e a tentativa de legitimação dessa atividade em nome de um suposto desenvolvimento do povo.

Lastreada nas demandas apresentadas por lideranças do povo Munduruku, no último dia 25 de setembro, a Polícia Federal deflagrou a segunda fase da “Operação Bezerro de Ouro

”, que inutilizou pás-carregadeiras, tratores e escavadeiras hidráulicas no interior da terra indígena Munduruku, provocando a revolta dos agentes econômicos que de forma criminosa patrocinam a extração ilícita de ouro e, de maneira articulada, financiou o bloqueio da BR 163, se utilizando da fração menor dos Munduruku, aliciada para justificar o garimpo na área indígena.

Na Era da Pós-verdade, é imperioso que sejamos vigilantes e capazes de defender os direitos e garantias fundamentais de todos os brasileiros, rejeitando que crenças pessoais e versões apaixonadas subvertam os fatos objetivos com os quais se constroem uma nação saudável e próspera, capaz de respeitar o direito à diferença.

Clique aqui

para ler a Carta aberta dos caciques e lideranças do Alto e Médio Tapajós sobre as invasões garimpeiras no território.

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