Thursday, June 6, 2013

A luta continua

Os Munduruku lideram o movimento de ocupação em Belo Monte. Foto: ©Eliza Capai / Greenpeace Em 1966, aviões da FAB partiam do nordeste do Mato Grosso rumo a Roraima, mais especificamente para a terra indígena de São Marcos. Era o ápice de um implacável projeto de colonização da região iniciado ainda nos anos 40, conduzido por frentes de expansão agropastoris e encabeçado pelo governo do estado. Nas aeronaves, estavam os últimos resistentes à remoção forçada de seu território tradicional, um grupo Xavante que vivia na região de Marãiwatsédé. A época, diferentes formas de violência fizeram com que a população Xavante sofresse um decréscimo vertiginoso e rivalidades internas com indígenas já estabelecidos no local propiciavam toda sorte de dificuldade na busca de seus direitos fundamentais. O caso, um dos mais emblemáticos capítulos da luta constante dos povos tradicionais, volta a tona com o relatório de violações entregue à Comissão Nacional da Verdade recentemente. Em um momento muito distinto de nossa história, é verdade, mas que escancara ao mundo uma série de abusos e violência desmedida contra essa população em tal grau, que nos remete instintivamente aos projetos colonialistas de outrora. Na terça-feira pela manhã, aviões da FAB se encarregaram de transportar os cerca de 140 indígenas liderados pelos Munduruku que integram o movimento de ocupação de Belo Monte a capital federal. Após muito tempo resistindo ao encontro e endossando a campanha do governo federal que, por meio da Casa Civil tem trabalhado incansavelmente em favor da PEC 215 e da CPI da Funai no sentido de esvaziar as atribuições do órgão condicionando os processos demarcatórios também a outras entidades, o ministro da secretaria geral da presidência da república Gilberto Carvalho cedeu aos pedidos e discursou ao grupo no plenário do Palácio do Planalto. A nona de uma série de cartas enviadas pelo grupo direcionadas a presidência da república, apesar de embasada e clara como todas as outras, não era mais e nem menos convincente. Apenas reforçava a posição de sempre. "Temos a ideia de que a conversa vai ser difícil, que a decisão da hidrelétrica tá tomada, mas a gente não aceita. Eles querem compensar a construção dizendo que vão melhorar a saúde, a educação na região. Não aceitamos e não queremos essas contrapropostas que sempre oferecem", alertou Valdenir Munduruku, uma das lideranças do movimento antes da viagem. Em nota oficial sobre o encontro, a secretaria da presidência diz que 'a proposta do governo prevê a realização de consulta aos indígenas de acordo com os preceitos da Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT)'. Consulta que, como a própria nomenclatura na convenção esclarece, deveria ser prévia e não retroativa, com os processos de estudos técnicos e início das obras já em curso. A representação da OIT no Brasil, por meio de sua assessoria de imprensa, não quis comentar o assunto e as possíveis consequências do não cumprimento do processo de consulta prévia tal qual estipulam as normas da convenção. Obviamente não foram cartas e nem uma possível mudança no posicionamento político adotado pelo governo que convenceram a secretaria geral da presidência a promover o encontro e taxá-lo como "o início de um processo de diálogo e entendimento", ainda conforme a nota oficial. Mas o temor das consequências e repercussão da reação em cadeia causada pelas malfadadas operações recentes de reintegração de posse em áreas demarcadas e atualmente ocupadas. Além da percepção sempre bem-vinda, ainda que tardia, de que a capacidade de articulação e resistência pacífica podem acabar se sobrepondo ao uso da força desproporcional e ao lobby poderoso daqueles que subestimaram a força dos movimentos sociais e da sociedade civil que pede por justiça e tratamento digno as minorias. "A resistência continua, não cederemos a pressão, não assinaremos documentos mal-intencionados, não temos medo. Temos apoio dos Xipaya, dos Kayapó, Arara, Tupinambá e outros primos espalhados por toda a região. Somos pacíficos e sabemos de nossos direitos", diz Valdenir. Enquanto o ministro discursava e lamentava a morte do Terena Oziel Gabriel, outro indígena da mesma etnia foi atingido pelas costas com um tiro também na região de Sidrolândia, no Mato Grosso, para onde outros 100 oficiais da força nacional de segurança estão sendo deslocados.

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