Foto: © Greenpeace / Robert Meyers
O ano passou como um tufão. 2013 nos brindou com momentos gélidos e
outros solares. Recarregados, colocamos nosso bloco na rua para lembrar
as autoridades a que viemos. Da Amazônia ao Ártico, do asfalto quente da
capital paulista às ladeiras estreitas de Vila Isabel, levamos a
mensagem de que a receita para se construir um futuro mais justo e
sustentável deve trazer a força revigorante dos jovens; a memória de
luta social e ambiental daqueles que passaram, mas não se foram em vão; o
esforço das florestas e seus guardiões, que tentam todos os dias se
manter de pé; e as mudanças de paradigma necessárias para alcançar um
modelo de desenvolvimento que atenda a todos e que evite as mudanças
reais do clima, que chegam cada vez mais implacáveis e imponentes.
Na semana do índio, em abril, fizemos coro junto aos primeiros habitantes da Terra Brasilis, verdadeiros representantes brasileiros, e documentamos a vida e a luta de um dos povos mais ameaçados do mundo, os Awá-Guajá, em um dos últimos remanescentes florestais do Maranhão. Frente às ameaças iminentes da bancada ruralista no Congresso Nacional nos últimos meses, levantamos a bandeira indígena em Brasília durante a Mobilização Nacional, e marchamos contra a destruição da última frente de resistência às barragens nos caudalosos rios amazônicos, como o Tapajós.
Do outro lado do mundo, fixamos uma bandeira a 4 km da superfície marítima e, com assinaturas de mais de 2.5 milhões de pessoas, declaramos o Ártico um santuário global. Envergonhamos empresas multinacionais como a Shell, que fez diversas tentativas de emplacar seus planos para perfurar o mar do Polo Norte em busca do óleo negro. No Brasil, mostramos como a exploração de pré-sal pode se tornar um “caminho sem volta”, colocando o país no rol dos grande vilões do aquecimento do planeta. Além disso, lançamos uma ferramenta online para monitorar o nível de decadência das plataformas offshore que surpreendentemente ainda estão em operação.
Enquanto tudo isso era exposto, tivemos um dos nossos navios de campanha apreendido ilegalmente por protestar pela preservação de um dos mais importantes e vulneráveis ecossistemas terrestres. Vimos o ativismo pacífico ser criminalizado e taxado de pirataria e vandalismo. Seria um prato cheio para contradizer as autoridades responsáveis e atingir nossos objetivos de campanha se não tivéssemos 28 ativistas e dois jornalistas, incluindo a brasileira Ana Paula Maciel, presos sob o frio comando do governo Putin. Recebemos mensagens de solidariedade de milhares de pessoas em todo o mundo, além de autoridades de diferentes países. Com forte apoio político e repercussão na mídia, nossos ativistas conquistaram liberdade provisória e acabaram anistiados pelo governo russo por um crime que não cometeram.
Apesar dos alertas da comunidade científica internacional, os governos mundo afora continuam direcionando seus investimentos energéticos para o uso de combustíveis fósseis, maiores emissores de gases causadores do efeito estufa na atmosfera. A Polônia, anfitriã da 19a Conferência das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (COP-19), sediou, ao mesmo tempo, uma reunião das maiores empresas que dominam a indústria do carvão – e envergonhou sua população frente a representantes de todo o globo.
Contraditoriamente, como prova máxima de que as mudanças climáticas são reais e urgentes, enquanto os negociadores debatiam a portas fechadas os acordos ideiais para suas economias (mesmo que isso represente nada, na prática), a população da República das Filipinas vivenciava o maior tufão já registrado no país. Mas isso não foi o bastante e os resultados foram pífios, com algumas nações inclusive voltando atrás em seus compromissos.
O Brasil, por sua vez, segue financiando não só o petróleo do pré-sal, para o qual realiza leilões sem nem mesmo apresentar um plano de contingência minimamente aceitável, mas também resolveu investir no fraturamento hidráulico não convencional para exploração de gás de xisto sem que haja uma regulamentação adequada para o tema. Como se não bastasse, trata-se de uma atividade extremamente sensível, cuja tecnologia envolve graves riscos ambientais.
A Política Nacional de Mudança do Clima (PNMC), que deveria ter sido plenamente implementada como parte do compromisso internacional de redução de emissões, ainda peca nas ações previstas para os planos setoriais. Vemos o Brasil transferir sua curva de emissões, que caíram do desmatamento e uso do solo, para o setor de energia. E vemos também o governo de braços cruzados para o problema. Lançamos um balanço das ações da PNMC, para mostrar que seguimos de olho.
De olhos bem abertos para o futuro também estão os moradores do Morro dos Macacos, em Vila Isabel, no Rio de Janeiro. Depois que o projeto Juventude Solar foi implantado, trazendo 20 painéis fotovoltaicos às casas para geração de energia, o sol passou a brilhar mais forte no morro que foi berço do sambista carioca Noel Rosa. Já na capital paulista, a campanha Cadê cobrou melhorias na mobilidade urbana, questionando os governantes sobre a falta de faixas de pedestre e políticas mais eficazes para meios de transporte alternativos, como ciclovias e linhas de metrô.
Pouco antes de se completar 25 anos da morte do líder seringueiro Chico Mendes, o símbolo da luta contra o apartheid, Nelson Mandela partiu desse mundo, deixando seus melhores ensinamentos. Durante os meses passados, o Greenpeace ficou sob novo comando, conquistamos um milhão de seguidores numa das redes sociais mais imporantes, o Facebook, e a Liga das Florestas, nossa plataforma online para coleta de assinaturas pela lei do Desmatamento Zero, adquiriu cara nova.
Muita coisa passou. Pessoas se foram, algumas entraram, outras tantas ficaram. Rindo ou chorando, freando ou seguindo, muitas vezes no atropelo – de direitos, de processos, do tempo –, o ano acabou deixando saudades. Ele se encerra com uma série de histórias para contar, mas muitas páginas em branco ainda por escrever. Assim, chamamos 2014! E que venha carregado de mais desafios, mais conquistas e, se couber na bagagem, mais vitórias.
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