Fabiana Alves, coordenadora da campanha de Clima e Justiça do Greenpeace Brasil
Neste 8 de março, precisamos falar de desigualdade de gênero e crise climática, que têm as mulheres na linha de frente dos mais impactados
Sou mulher, considerada branca, apesar de minha descendência Kaingang e Xavante, sem grandes problemas financeiros, e criada para não ser quem sou, mas sim uma continuação dos desejos e anseios do patriarcado – um sistema que impõe à mulher uma condição inerente à sua existência, que é a condição de luta, pois só assim consegue acessar espaços que lhe são de direito, mas ainda predominantemente dominados por homens.
Também fui criada para ser branca, numa tentativa de invisibilizar minhas origens. Sair dessa condição é dolorido e um teste diário, pois exige remar contra uma forte maré e agir diferente perante uma sociedade que agride a mulher, não apenas em atitudes físicas e verbais, mas também estruturais.
A crise climática é mais uma das lutas impostas à mulher. Quando a crise do clima se manifesta em eventos extremos, é a mulher quem está condicionada à casa, muitas vezes com renda menor do que a do homem, e, portanto, moradora de áreas de riscos, sendo assim a mais atingida. 80% das pessoas que precisam deixar suas casas por conta de eventos extremos são mulheres.
Falar de emergência climática é falar também de desigualdades e preconceitos, pois as alterações do clima são uma consequência da estrutura social que está posta, e não será combatida sem que a pobreza, que recai mais sobre a mulher, especialmente a mulher negra e indígena, seja confrontada por todos.
Quando vulnerabilidade e opressão se somam
A mudança do clima agrava ainda mais o cenário de quem já vive historicamente uma grave violação de direitos. De acordo com as estatísticas mais recentes, no primeiro semestre de 2019, foram registrados 636 feminicídios. No mesmo período de 2020, foram contabilizados 648 casos. Das vítimas de feminicídio no Brasil, 66,6% foram negras.
Além de situações extremas, o machismo segue se fazendo presente no silenciamento da mulher em salas de reuniões, na desigualdade salarial e no nosso condicionamento a segundo plano.
Assim como em todas as outras estruturas da sociedade, o silenciamento faz com que a mulher também não tenha o mesmo espaço de voz que o homem no combate à crise do clima e, com isso, a mudança para uma sociedade de direitos iguais segue sendo tardia e orquestrada nos mesmos moldes que a causaram.
Hoje é 8 de março, data conhecida como o Dia Internacional da Mulher, mas é principalmente um dia necessário para que paremos um segundo para pensar nas estruturas que nos levam a um mundo doente, que se alimenta da desigualdade e onde, infelizmente, pensar no direito da mulher não faz parte dos esforços diários, tampouco é natural à maior parte da população. Pensar no meu direito é também pensar nas desigualdades. O direito da mulher precisa ser respeitado por todos para que ele então de fato exista.
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