O sistemático ataque dos ruralistas sobre as terras públicas no Brasil
ganhou força nos últimos anos e evidencia a decisão do Estado de
entregar as áreas protegidas da Amazônia aos interesses do agronegócio,
do setor florestal e da mineração
Ao assumir o comando do Congresso e do Planalto, a
ditadura ruralista avança no Brasil com a chuva de medidas provisórias
editadas pelo governo Temer e ratificadas pelo Congresso Nacional, em um
duro golpe para o maior patrimônio ambiental do país: a Amazônia.
Recheada de cinismo e cobiça, a escalada de ações para diminuir as áreas
protegidas da maior floresta tropical do planeta passou a andar de mão
dadas com a decisão histórica de impedir a demarcação das terras
indígenas que, após 29 anos da Constituição de 1988, ainda não foram
reconhecidas pelo Estado brasileiro – muitas delas sequer identificadas
e delimitadas, colocando em risco a sobrevivência cultural desses
povos.
Criado para proteger o mar de floresta que envolve a famosa
estrada que liga Cuiabá à cidade de Santarém, no Pará, o Mosaico da
BR-163 vem sendo desfigurado para atender à incessante demanda do
agronegócio brasileiro por mais terra, embora o setor continue enchendo o
peito para alardear sua produtividade e sua capacidade de ampliar a
produção sem a necessidade de destruir nem mais um palmo de floresta.
No último dia 11 de abril, a Comissão Mista que reúne
senadores e deputados aprovou as MPs 756 e 758. As duas medidas seguem
agora para aprovação do plenário da Câmara. Se aprovadas, o mosaico de
áreas protegidas da BR-163 deve perder mais de 1 milhão de hectares –
beneficiando áreas griladas que poderão ser regularizadas. Se depender
da vontade da famigerada bancada ruralista que domina o Congresso, é
certo o avanço sobre a Floresta Nacional do Jamanxim, a Reserva
Biológica Nascentes da Serra do Caximbo, o Parque Nacional do Jamanxim e
a Floresta Nacional Itaituba II.
Embora muitos incautos acreditem na propaganda oficial de
que o agronegócio é a salvação do Brasil, o sistemático e coordenado
ataque dos ruralistas sobre as terras públicas no Brasil ganhou força
nos últimos anos e evidencia a decisão do Estado brasileiro de entregar
as áreas protegidas da Amazônia aos interesses do agronegócio, do setor
florestal e da mineração; ignorando os direitos de populações
tradicionais e povos indígenas da região, ou mesmo os tratados
internacionais de proteção ambiental, a exemplo da Convenção de
Biodiversidade e do Acordo de Paris.
O motivador econômico dos ruralistas fica ainda mais
evidente quando se analisa a proposta de redução da Floresta Nacional
Itaituba II em 169 mil hectares, para a criação da Área de Proteção
Ambiental Trairão. Os limites da nova Unidade de Conservação seguem
fielmente as estradas ilegais abertas para a exploração também ilegal de
madeira no norte da Floresta Nacional Itaituba IIalém de se sobrepor a
16.000 hectares da Terra Indígena Sawré Muybu, identificada e delimitada
pela Fundação Nacional do Índio (Funai) em 19 de abril de 2016, após 15
anos de luta do povo Munduruku.
Em sobrevoo realizado pelo Greenpeace em 17/06/2016, foi
possível confirmar uma série de estradas ilegais que davam suporte a
extração ilegal no interior da Floresta Nacional de Itaituba II,
conforme demonstram a fotos a seguir.
Escondida sob a copa das arvores, madeira ilegal aguardando
para ser transportada do norte da FLONA Itaituba II. Foto: Rogério
Assis/Greenpeace
Embora constitucional, o direito originário do povo
Munduruku aos 178.000 hectares do território de Sawré Muybu continua
sendo ignorado pelo Estado brasileiro – o mesmo Estado que, do dia para a
noite, resolve dar de presente 169.000 hectares a grileiros e
madeireiros. Com isso, o governo reafirma sua preferência em proteger os
interesses ruralistas em vez de cumprir seu dever constitucional de
compensar àqueles que historicamente foram privados dos seus territórios
tradicionais.
Madeira ilegalmente extraída no norte FLONA Itaituba II. foto: Rogério Assis/Greenpeace
O intenso esforço do governo Michel Temer e da bancada
ruralista para entregar a Amazônia e seus povos aos interesses do
agronegócio nacional revela a visão tacanha de país, calcada no desprezo
pela natureza e pelo conhecimento sobre ela, no esbulho de direitos
tradicionais em função de interesses econômicos imediatos, na ignorância
sobre a diversidade cultural e na leniência quanto à própria identidade
nacional.
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