Postado por Rodrigo Gerhardt
Estudo inédito avalia o impacto do óleo diesel no transporte
público da cidade de São Paulo e mostra que adoção de combustíveis
renováveis na frota de ônibus pode evitar 12,7 mil mortes e gerar uma
economia de R$ 3,8 bilhões até 2050. Na prática, significa salvar uma
vida por dia em todo o período
São Paulo possui uma frota de quase 15 mil ônibus,
responsáveis por quase metade da poluição do ar na cidade - Foto: Dennis
Fidalgo
A poluição do ar na maior metrópole do país será responsável por
mais de 178 mil mortes e ter um custo de quase R$ 54 bilhões nos
próximos 33 anos, ou seja, até 2050, se nada for feito para diminuí-la.
Um dos grandes contribuintes de toda esta poluição são os ônibus do
transporte público que rodam diariamente pela cidade de São Paulo,
despejando fumaça tóxica no ar.
Embora eles representem menos de 3,6% dos veículos a diesel que
circulam na região metropolitana, os ônibus são responsáveis por 35,2%
do material particulado (fuligem) que é emitido por toda a frota urbana.
Substituir completamente o diesel por biodiesel e eletricidade,
portanto, pode salvar milhares dessas vidas e economizar bilhões de
reais dos cofres públicos. É o que revela o estudo “
Avaliação
e Valoração dos Impactos da Poluição do Ar na Saúde da População
Decorrente da Substituição da Matriz Energética do Transporte Público na
Cidade de São Paulo”
, realizado pelo Instituto Saúde e Sustentabilidade (ISS) em parceria com o Greenpeace,lançado nesta quarta-feira (17).
No estudo os pesquisadores consideraram três cenários possíveis para o período entre 2017 e 2050:
1)
A continuidade das políticas atuais para a frota, com predomínio do Diesel B7 (7% de biodiesel na composição).
Neste cenário, contabilizam-se 178.155 mortes atribuíveis à poluição do ar devido ao material particulado inalável fino (MP
2,5)
e um custo estimado em cerca de R$ 54 bilhões, em valores de 2015,
considerando a perda de produtividade destas mortes precoces. Também
seriam contabilizadas 189.298 internações públicas e privadas com custo
estimado em R$ 634,7 milhões.
2)
A adoção de 100% de combustíveis renováveis, na combinação
de três tipos de fontes energéticas: biodiesel (B100), híbrida (B100 +
elétrica) e elétrica, a partir de 2020.
Estimam-se 12.191 vidas salvas (6,8% do total de mortes) até 2050, o
que evitaria uma perda de produtividade estimada em R$ 3,6 bilhões, além
da redução de 13.082 internações públicas e privadas.
3)
A substituição de 100% de diesel por ônibus elétrico, a partir de 2020.
No cenário mais otimista, seriam 12.796 vidas salvas (7,2%), perda de
produtividade evitada estimada em R$ 3,8 bilhões e a redução de 13.723
internações. A substituição da matriz energética atual pelos cenários 2 e
3 representa uma economia de aproximadamente R$ 44, 5 milhões e R$ 46,5
milhões respectivamente, comparado ao B7, em relação a gastos com
internações públicas e privadas.
A poluição do ar em São Paulo poderá custar R$ 54 bilhões e
178 mil vidas até 2050 - Foto: Rafael Neddermeyer/ Fotos Públicas
“Cigarro sobre rodas”
Os benefícios da eliminação do diesel no transporte público para a
saúde e a economia local se devem pela redução de material particulado
inalável fino (MP
2,5), cujo nível considerado “aceitável” pelo município é o dobro do que recomenda a Organização Mundial de Saúde.
Produzido principalmente a partir da queima de combustíveis fósseis, automóveis, incineradores, fogões a gás e tabaco, o MP
2,5 é
capaz de chegar aos pontos mais profundos do pulmão, nos alvéolos
pulmonares, onde há trocas gasosas, e entrar na circulação sanguínea
causando danos à saúde.
“Os ônibus a diesel são como cigarros sobre rodas – poluem o ar tanto
quanto o fumo que foi proibido em locais públicos fechados. Uma hora de
exposição ao trânsito equivale a fumar um cigarro”, afirma a médica
Evangelina Vormittag, diretora do Instituto Saúde e Sustentabilidade e
uma das coordenadoras do estudo.
Segundo a Organização Mundial da Saúde, a poluição do ar é a
principal causa de mortes por complicações cardiorrespiratórias
relacionadas ao meio ambiente e a líder em riscos para a saúde,
superando as mortes por malária, consumo de água insalubre e falta de
saneamento básico. Além do câncer de pulmão e de bexiga, a poluição do
ar se relaciona à depressão, ao maior risco de arritmias e infarto agudo
do miocárdio; bronquite crônica e asma. "Ela pode reduzir a expectativa
de vida em 15 anos na cidade", diz Evangelina.
A fumaça emitida pelos ônibus está ligada a diversas doenças
cardiorrespiratórias, câncer, depressão e problemas neurológicos. Foto:
Natalie Sparaciali
Oportunidade de mudar é agora
A Lei Municipal do Clima (Lei n°14.933/2009) determina que a partir
de 2018 toda a frota municipal seja abastecida com 100% combustíveis
renováveis. O Greenpeace defende que a medida seja cumprida e já mostrou
em outro relatório essa transição para os veículos elétricos é uma
medida viável e está ao alcance da Prefeitura, que atualmente prepara uma nova licitação para o sistema de ônibus da cidade, ainda este ano.
“Apesar de ser relativamente pequena diante do total de veículos na
cidade, a frota de ônibus é um alvo estratégico e prioritário para
intervenção em função do seu grande peso ambiental para a cidade. É
possível trocar a frota gradualmente a partir da renovação dos veículos
velhos que já é prevista em contrato”, afirma Davi Martins, da campanha
de Mobilidade do Greenpeace.
Para o médico patologista e diretor do Instituto de Estudos Avançados
da USP, Paulo Saldiva, essa dimensão, inclusive financeira, do impacto
na saúde, precisa ser levada em conta na tomada de decisões. “Os
gestores públicos questionam quanto custa mudar a matriz, mas quanto
custa manter a atual? Continuar com o diesel é subsidiar uma política
energética ultrapassada com carne humana, a custa da saúde de nossos
filhos e das nossas coronárias”, afirma.
Ativistas do Greenpeace realizam pesquisa informal com a população.