Estudo da Coppe/UFRJ em parceria com o Greenpeace mostra que mesmo com o
dobro da frota de carros em 2030, emissões podem ser menores que
atuais, caso indústria adote metas de eficiência energética europeias.
Transporte foi um dos setores cujas emissões mais cresceram ultimamente. Foto: Greenpeace/Otavio Almeida
Se a indústria brasileira de automóveis adotar meta de eficiência
energética alinhada à europeia, as emissões de gases estufa dos veículos
nacionais reduzirá substancialmente: mesmo que dobre o número de carros
nas ruas do país em 2030 – como é estimado –, as emissões, ainda assim,
seriam cerca de 10% menores que as de 2010. A conclusão é do estudo Eficiência Energética e Emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE),
produzido pelo Coppe/UFRJ (Instituto Alberto Luiz Coimbra de
Pós-Graduação e Pesquisa de Engenharia da Universidade Federal do Rio de
Janeiro), em parceria com o Greenpeace.
“O Brasil é o quarto maior mercado de automóveis do mundo e, no
entanto, estamos muito atrasados quando o assunto é eficiência
energética e consumo de combustíveis dos veículos. Vários países têm
adotado metas rigorosas para que seus carros reduzam o consumo
energético e emitam menos gases estufa. É hora das montadoras que operam
no Brasil assumirem a responsabilidade pelo impacto que têm no clima e
serem coerentes ao adotar padrões similares aos que elas já têm lá
fora”, diz Iran Magno, coordenador da campanha de Clima e Energia do
Greenpeace.
Nos últimos anos, as emissões brasileiras do setor de transporte
cresceram vertiginosamente. De 1990 a 2012, segundo o Observatório do
Clima, esse aumento foi de 143%. Na próxima semana, o IPCC (Painel
Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU) divulga mais um
relatório com conclusões de cientistas sobre a crise climática global.
Um vazamento dos dados divulgado essa semana pela imprensa internacional
mostra que, até 2050, as emissões de transporte devem ser as que mais
crescem no mundo, puxadas principalmente por países emergentes.
Hoje, a única meta que o Brasil tem de eficiência energética veicular
é voluntária, estipulada pelo programa Inovar-Auto, do governo federal.
Este é o cenário de referência do estudo. Os cálculos da Coppe/UFRJ
mostram que, caso a indústria siga essa meta – que representa um ganho
de 12% em eficiência até 2017 – as emissões veiculares em 2030 seriam de
88Megatoneladas de CO2 equivalente (Mton CO2 eq). Mas se o país for
mais ousado e adotar a mesma meta definida pela União Europeia – de 1,22
MJ/km até 2021 – entre 2010 e 2030 teríamos deixado de emitir quase 2
vezes o que foi emitido pelos veículos leves em 2012.
O professor Emilio La Rovere, do Programa de Planejamento Energético
da Coppe, diz que é fundamental a criação de uma política de estímulo
aos fabricantes e compradores de veículos leves para se reduzir o
consumo de combustíveis como gasolina, álcool e gás natural.
De acordo com o professor, que coordena o Centro de Estudos
Integrados sobre Meio Ambiente e Mudanças Climáticas (Centro Clima) da
Coppe, uma das alternativas é reduzir o valor dos impostos para quem
fabricar veículos com mais eficiência energética. “Já os fabricantes de
veículos com baixa eficiência passariam a pagar um imposto mais alto. E,
como o carro é objeto de desejo de muitas pessoas, pode ser dado a elas
uma redução no valor do IPVA no ato da compra. O nosso estudo mostra
que tais medidas são possíveis”, afirma o professor da Coppe.
Os dadosO estudo da Coppe/UFRJ compara três
cenários de eficiência energética na frota de veículos do Brasil, e
aponta as diferenças entre elas nas emissões de gases estufa até 2030.
Nos três casos, o ano base é 2011, quando a eficiência média dos
veículos novos estava em 2,07 MJ/km e as emissões totais eramde 79 Mton
CO2 eq – cinco vezes o que a cidade de São Paulo emitiu no ano de 2011.
O primeiro cenário é o descrito acima, em que a indústria alcança a
meta voluntária estipulada pelo programa Inovar-Auto. No segundo
panorama, moderado, a Coppe considerou que os carros produzidos no país
atingiriam a mesma meta de eficiência adotada pela Europa – só que
apenas em 2023, com dois anos de atraso. Nesse caso, as emissões em 2030
chegariam a 68Mton CO2 eq.
No terceiro cenário, o mais otimista, foi considerado que os veículos
novos brasileiros já estariam equiparados às metas de eficiência
europeia em 2021, mesmo ano que o bloco europeu estipulou para que os
carros cheguem à média de 1,22 MJ/km. Desse modo, as emissões totais dos
automóveis brasileiros alcançariam 67Mton CO2 eq. Em 2030, se
compararmos este cenário com o de referência, a redução de emissões
seria de quase 24%.
“Além de voluntárias, nossas metas de eficiência são muito pouco
ousadas se levarmos em conta que o Brasil é, e vai continuar sendo pelos
próximos anos, um dos principais mercados de carro do mundo. Montadoras
e governo precisam viabilizar meios para que os carros produzidos sejam
mais limpos e eficientes, alinhados com a realidade de outros mercados
automobilísticos”, defende Magno.
Para o Greenpeace, as discussões sobre eletromobilidade também
precisam ganhar relevância no Brasil, para que a dependência de
combustíveis fósseis seja quebrada aos poucos. “Nesse momento, a
eficiência energética é a medida mais emergencial. Mas a
eletromobilidade é o seguinte passo nesse desafio. E essas questões
interessam à própria indústria e à economia do país, pois produzir
carros de ponta significa gerar empregos e abrir mercados de
exportação”, diz Magno, ao lembrar que a solução de longo prazo inclui
necessariamente o aprimoramento do transporte público.
O aumento da frota de veículos individuais no Brasil é um fato. Por
isso, é necessário adotar medidas rigorosas para que esses carros
cheguem às ruas da maneira mais limpa possível. “Mas paralelamente a
isso, os governos precisam melhorar muito o sistema de transporte
público, para que a população também tenha condições de fazer a opção
por veículos de massa em seus deslocamentos”, defende o pesquisador do
Centro Clima da Coppe, William Wills.
Nos últimos anos, enquanto o desmatamento – considerado o grande
vilão das emissões brasileiras – reduziu substancialmente, a
contribuição da área de energia só fez crescer. E o principal
responsável por esse aumento foi o largo consumo de combustíveis fósseis
no sistema de transporte. Justamente por ter se tornado um dos maiores
contribuidores do aquecimento global no país, o setor de transportes tem
ainda largo espaço para ações de mitigação. “A questão é de escolha: o
Brasil vai optar pelo passado ou vai liderar um revolução para o
futuro?”, questiona Magno.
O download do estudo pode ser feito aqui.
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