Indígenas Munduruku em audiência com o ministro-chefe da
Secretaria-Geral da Presidência da República
(©Greenpeace/Wenderson Araújo).
O ano de luta já começou para os 13 mil indígenas do povo Munduruku. Enfrentando uma viagem de quatro dias de ônibus, uma comitiva de 30 lideranças chegou a Brasília nesta semana para uma agenda de reuniões com o governo a fim de pressionar pela garantia de seus direitos.
As pautas continuam as de sempre: a cobrança pela demarcação oficial de seu território, mais especificamente a Terra Indígena Sawré Muybu, na região do Médio Tapajós e que abrange os municípios de Itaituba e Trairão (PA); e a entrega do documento que especifica o modo como eles desejam ser consultados pelo governo no que tange à construção do Complexo Hidrelétrico do Tapajós, que atropela e literalmente afoga por inteiro aldeias, roças, cemitérios e áreas de caça de sua população.
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O processo de formalização do território como terra indígena já se arrasta por cerca de uma década, chegando ao ponto de os indígenas terem iniciado a autodemarcação independente. Na reunião, eles ressaltaram a importância da demarcação formal para proteção de sua população e dos recursos naturais do território. Eles mostraram, inclusive, fotos tiradas durante a autodemarcação onde foram identificados focos de extração ilegal de madeira e garimpo.
Ao cobrar uma posição, o cacique de Sawré Muybu, Juarez Munduruku, chegou a falar em coragem. “Queremos saber se agora temos um presidente corajoso o suficiente para assinar o relatório. Quero levar essa resposta pro meu povo agora, pois quem está correndo risco de vida somos nós”, afirmou.
Ademir Kabá, outra liderança, lembrou que o estado brasileiro só vem aumentando ao longo dos anos sua dívida com os povos indígenas. “A nossa vinda aqui é constrangedora, porque estamos reivindicando o reconhecimento das terras dos nossos ancestrais, lugar em que vivemos desde que nascemos, e o estado continua nos negando isso.”
‘Jogo de empurra’
Em recente entrevista à Agência Pública, a ex-presidente da Funai, Maria Augusta Assirati, afirmou que o relatório, pronto e aprovado desde 2013, não foi publicado por conta dos interesses governamentais para a construção de empreendimentos hidrelétricos na região, especialmente a usina São Luiz do Tapajós. “Nós, como Funai, havíamos assumido um compromisso com os Munduruku no sentido da publicação do relatório, e tivemos que descumprir esse compromisso em razão da prioridade que o governo deu ao empreendimento. Isso é grave”, diz Assirati.
Como novo presidente, Chiarelli respondeu que não se trata de uma questão de coragem, e reconheceu o entrave junto a outros setores do governo. “Quando surgiu essa proposta de delimitação, os outros órgãos que também têm interesse naquela área, principalmente com relação à hidrelétrica de São Luís do Tapajós e à Flona de Itaituba, pediram pra se manifestar. Há um questionamento sobre a ocupação tradicional e o que eu pedi foi que eles apresentassem relatórios técnicos que provem isso. A Funai fez o seu papel e apresentou o seu relatório atestando que ali é uma terra indígena. O que não dá é pra ficar nessa indefinição, esse jogo de empurra”.
Quanto aos focos de exploração ilegal, ele se comprometeu a tentar articular uma operação conjunta com órgãos ambientais, seja em âmbito estadual ou federal, para tentar frear essas atividades. “Enquanto a terra indígena ainda não estiver regularizada, infelizmente a Funai sozinha não consegue fazer nada. Nossa situação e os instrumentos legais de que dispomos também são frágeis.”
Protocolo de Consulta
Na parte da tarde, as lideranças tiveram uma audiência pública com o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência da República, Miguel Rossetto, a quem entregaram o Protocolo de Consulta do povo Munduruku a propósito da construção de empreendimentos de infraestrutura em seus territórios.
O documento, elaborado pelo povo no fim do ano passado, sistematiza a maneira com que eles desejam ser consultados pelo governo, uma exigência e um direito previstos tanto na Constituição quanto na Convenção 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho).
Ademir Kabá frisou que a entrega do protocolo, entretanto, não é o fim das discussões, mas uma demonstração clara de que os Munduruku querem o diálogo. “Queremos abrir mais espaços de conversa com o governo. A gente luta por terra, não por riqueza. Para nós, nossa terra é a nossa vida, nossa história. Em hipótese alguma queremos a usina São Luiz do Tapajós. A construção desse empreendimento pra nós significa a morte”, afirmou. O ministro se limitou a ouvir e se comprometeu a ler e analisar o documento.
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