Friday, October 1, 2021

BR-319: organizações e sociedade civil repudiam ataques sofridos por cientista em audiência pública

Greenpeace Brasil  

Philip Fearnside, um dos mais respeitados pesquisadores da Amazônia, foi vítima de comentários xenofóbicos

Manaus 2021: The Impacts of the Rio Negro's Record Flood. © Rodrigo Duarte / Greenpeace
Pesquisador é reconhecido mundialmente como uma das maiores autoridades no que diz respeito aos estudos sobre a Amazônia © Rodrigo Duarte / Greenpeace

O pesquisador do Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa), Dr. Phillip Fearnside, foi alvo de ataques xenofóbicos durante uma audiência pública sobre o licenciamento para obras na BR-319. O evento foi realizado pelo Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) na noite da última segunda-feira (27), no Centro de Convenções Vasco Vasques, em Manaus (AM).

As ofensas aconteceram após Fearnside apresentar um artigo com argumentos contundentes, a partir de uma análise com bases técnicas e científicas, sobre as obras na rodovia e de seus impactos socioambientais. 

O pesquisador, que é norte-americano e vive e atua na Amazônia há mais de 40 anos, é integrante do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas da ONU, e foi laureado com o Prêmio Nobel da Paz em 2007 por sua contribuição na luta contra a crise climática. Philip Fearnside é reconhecidamente uma das maiores autoridades científicas do mundo no que diz respeito à Amazônia. Ele é respeitado internacionalmente e importante referência por seus estudos e pesquisas que ajudaram a entender a dinâmica ecossistêmica da maior floresta tropical do planeta.

As instituições, entidades de pesquisa e pesquisadores, e organizações da sociedade civil abaixo-assinadas repudiam e consideram inaceitáveis os ataques sofridos pelo cientista, que vem incansavelmente há décadas dedicando sua vida e esforços pela conservação da Amazônia. Um desafio extremo, como sabemos, considerando toda a dificuldade de se empreender pesquisa e ações de conservação no Brasil.

Discriminação é um comportamento abominável, criminoso e inconstitucional, se considerarmos que a Constituição Federal proíbe qualquer tipo de discriminação racial, étnica, religiosa, de gênero ou por nacionalidade. Dessa forma, repudiamos fortemente os ataques e manifestações desrespeitosas e xenofóbicas dirigidas ao Dr. Fearnside durante a audiência pública citada.

Esse fato e seus desdobramentos, demonstram a fragilidade e despreparo das instituições públicas responsáveis pelo processo de licenciamento das obras de repavimentação da BR-319. As audiências públicas de um licenciamento são uma exigência legal que muitas vezes têm sido realizadas pró-forma, quando devem ser ocasiões para debates críticos e construtivos, com dinâmica e metodologia adequadas que permitam que ajustes, melhorias e mesmo que questionamentos ao projeto sejam propostos e considerados, de modo que o ele seja reavaliado, melhorado ou  mesmo cancelado.

Um processo tão longo como este, que se arrasta há anos justamente pela falta de seriedade na sua condução, não pode ser discutido agora de forma superficial. Muitos trabalhos científicos comprovam que a repavimentação da BR-319, da forma como está sendo proposta, é um risco enorme para a integridade da Amazônia e afetará profundamente a vida de milhões de pessoas. Foi justamente este alerta que o Dr. Fearnside  tentou expor na audiência. No entanto, em vez de encontrar no evento um espaço democrático para apresentar este alerta, o cientista sofreu uma tentativa de silenciamento e descredibilização, em um ambiente hostil e truculento, bastante fragilizado pela baixa audiência.

Acreditamos que a ciência é um elo fundamental do nosso destino comum e uma oportunidade para construir uma sociedade mais justa, diversificada e sustentável. Pesquisadores renomados como o Dr. Fearnside vêm alertando há tempos sobre os possíveis impactos da reconstrução da BR-319 no bioma Amazônia, que serão irreversíveis e podem nos jogar no abismo do ponto de não retorno, onde espécies e uma série de benefícios e serviços ecossistêmicos, hoje proporcionados pela floresta, serão perdidos, afetando a vida de toda a humanidade.

Alertamos, ainda, que os estudos de impacto ambiental sobre a rodovia, apresentados pelo Dnit e pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) na audiência, estão incompletos e com graves problemas técnicos, uma vez que não delimitam a área de influência do projeto e foram realizados de forma superficial e sem a qualificação requerida para uma avaliação tão importante. É inacreditável que mesmo existindo dezenas de instituições públicas de grande qualificação e experiência na região como Inpa, Ufam, UEA, Ifam, UFIR, nenhuma delas tenha sido convidada a participar ou avaliar os estudos realizados.

Somado à precariedade dos estudos ambientais, ainda há o agravante de que as demandas das populações indígenas e das comunidades tradicionais estão sendo sistematicamente ignoradas. Os estudos do componente indígena, bem como a realização das consultas prévias, livres, informadas e de boa-fé, como preconiza a Organização Internacional do Trabalho (OIT) em sua Convenção nº 169, têm sido proteladas e deveriam ocorrer antes das audiências públicas gerais.

Por fim, reiteramos nosso repúdio ao modo de condução da audiência pública por seus organizadores, que, ao não se posicionarem contra as agressões sofridas pelo Dr. Fearnside, permitiram que o debate público fosse desvirtuado de sua finalidade de informar ao público, para se transformar em palco de negacionismo, desinformação e de campanha política com fins eleitoreiros.

Agressões não são argumentos válidos e não podem ser aceitas em discussões públicas, ainda mais em audiências promovidas pelo Poder Público, que deveriam conduzir o debate primando pelo respeito aos diferentes pontos de vista. É dever do Poder Público não admitir e rechaçar imediatamente o discurso de ódio promovido e que tem sido sistematicamente  ampliado. Assim, solicitamos providências para que estas agressões sejam formalmente repudiadas pelos responsáveis por essa audiência, que, a rigor, deveria ser reagendada e novamente realizada em condições apropriadas. Esperamos que seja revisto o método de aplicação e condução das audiências públicas e que os próximos eventos tenham melhor dinâmica e preparo. As audiências públicas devem ser espaços verdadeiramente democráticos que de fato contribuam com a discussão qualificada sobre obras na BR-319 e outras que estão por ser apreciadas e licitadas.

Assinam este documento pesquisadores e sociedade civil:

Conselho Nacional das Populações Extrativistas (CNS)

Greenpeace Brasil

GT Infraestrutura

Instituto de Conservação e Desenvolvimento Sustentável  da Amazônia (Idesam)

Movimento Ficha Verde (MoFV)

Observatório BR-319 (OBR-319)

Transparência Internacional Brasil (TI-Brasil)

WCS Brasil

Instituto de Desenvolvimento Sustentável Mamirauá (IDSM)

Instituto Internacional de Educação do Brasil (IEB)

Operação Amazônia Nativa (OPAN)

Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora)

Instituto Mapinguari (IMAPIN)

Instituto Ecos de Gaia (EGA)

Instituto Socioambiental – ISA

WWF-Brasil

Instituto de Pesquisas Ecológicas (IPE)

Instituto Salve Mar (Movimento Salve Maracaípe)

Instituto Juruá 

Rede Sustentabilidade Amazonas

Movimento Ecotrabalhismo PDT AM

Mater Natura – Instituto de Estudos Ambientais

Instituto Regeneração Global

Associação de Pós-graduandos da Universidade Federal do Amazonas (APG-UFAM)

Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Ambiente e Sociedade (ANPPAS)

Associação dos(as) Pós-graduandos(as) do INPA – MigAPG/INPA

Rede Transdisciplinar da Amazônia (RETA)

Articulação Parintins Cidadã

Teia de Educação Ambiental e Interação em Agrofloresta

Articulação Nacional de Movimentos e Práticas de Educação Popular e Saúde

Comissão Pró Índio do Acre (CPI-Acre)

Espaço de Formação Assessoria e Documentação – São Paulo
Abraço Guarapiranga – São Paulo 

Rede Barragens Amazônicas / Amazon Dams Network (RBA/ADN)

Fundação Grupo Esquel Brasil FGEB

Associação Toxisphera de Saúde Ambiental

Associação SOS Amazônia

Associação de Defesa Etnoambiental – Kanindé

Comitê Chico Mendes

Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais para o Desenvolvimento e o Meio Ambiente 

Uma Gota no Oceano

Instituto Diadorim para o Desenvolvimento Regional e Socioambiental/iD (MG)

Observatório do Clima  – OC

Rede de ONGs da Mata Atlântica- RMA

Movimento “Eu rejeito barragens em Sabará”

Professorxs do Curso de Arqueologia da Universidade Federal do Oeste do Pará

Helder Lima de Queiroz – IDSM/SCM

Gleice Oliveira – Historiadora e professora

Neiva Araujo – Grupo de Pesquisa Direito, Território & Amazônia – Diterra/Unir 

Angélisson Tenharim – liderança do povo Tenharim

Davyd Spencer R. de Souza, Sociólogo, DCiS-UFAM

Maria Anete Leite Rubim

Anete Rubim

Daniel de Paiva Silva – IF Goiano, campus Urutaí 

Steffanie Schmidt – Jornalista – DRT/MT  1329

Yuri Breno da Silva e Silva

Carlos Edwar de Carvalho Freitas, Universidade Federal do Amazonas

Rita Mesquita – INPA

Maria Cecília Wey de Brito – Instituto Ekos Brasil

Ivaneide Bandeira Cardozo – Kanindé

Camila C. Ribas – Pesquisadora INPA

Taiguã Corrêa Pereira – doutorando PPGBot / INPA

Fernanda de Pinho Werneck – Pesquisadora INPA

Cecilia Veronica Nunez – INPA

Eron Bezerra – Professor Doutor UFAM 

Anete Rubim –  UFAM

Albertina Lima

Kaio Cesar Marinho da Cunha – INCT-INPA

Vincenzo Lauriola – MCTI

Sidineia Aparecida Amadio, Pesquisadora aposentada/INPA

Jansen A. S. Zuanon, Biólogo, Pesquisador da COBIO/INPA

Jussara Santos Dayrell, Bióloga, Doutoranda ECO/Inpa

Gabriel Costa Borba, Biólogo, Doutorando na Virginia Polytechnic Institute and State University (Virginia Tech)

Neliton Marques da Silva – FCA/UFAM

Nágila Alexandre Zuchi – Doutoranda -PPG-BADPI/INPA

Mauro Scarpinatti – Economista, professor universitário

Andrea V. Waichman – UFAM

Lucia Rapp Py-Daniel – INPA, pesquisadora

Rosana Barbosa de Castro – DCF/FCA/UFAM

Virgílio Maurício Viana – Superintendente Geral da Fundação Amazônia Sustentável

Miguel Petrere Junior – Universidade Federal do Pará

José Eurico Ramos de Souza – IFAM-CMZL

Iolanda da Silva Moutinho – Mestranda PPG-ECO /INPA

Flora Magdaline Benitez Romero – INPA

Cristine Luciana de Souza Rescarolli – FAS

Alberto Vicentini – INPA-CODAM, pesquisador

Luiza Magalli Pinto Henriques – INPA/COPES, Analista em C&T

Carolle Alarcon – UICN Brasil

João Ferraz – Pesquisador INPA

Patricia Marques do A. Oliveira – Mestranda PPGBA/UFPE 

Carolina Ramirez Mendez – SDSN Amazônia

Solana Meneghel Boschilia- UFPA 

Pedro Murilo Sales Nunes – professor adjunto –  UFPE 

Rosa dos Anjos – FAS

Paulo Braga Mascarenhas Júnior- UFPE

Layon Oreste Demarchi – Doutorando PPG-Bot-INPA

Aretha Alves Pereira – FAS

Anne Rapp Py-Daniel – Universidade Federal do Oeste do Pará

Thereza Beatriz Lira Melo – UFPE

Paulo Maurício Alencastro Graça – Pesquisador INPA

Maria Teresa Fernandez Piedade  – Pesquisadora INPA

Manuela Carneiro da Cunha – Antropóloga, Professora Titular aposentada da USP e Professora Emérita da Universidade de Chicago 

José Sabino – Professor e pesquisador, Uniderp 

Aurelio Michilies – Cineasta

Marcos Antonio Isaac Júnior – Pós-doutorando INPA

Thomas M. Lewinsohn – Professor Titular aposentado da Unicamp e Pesquisador Sênior CNPq

Isabela Freitas Oliveira – Doutoranda PPG/ECO INPA

Luciana Rebellato – OPAN

Ricardo de Oliveira Perdiz – Biólogo

Carlos Alfredo Joly – Professor Titular aposentado da Unicamp

Luciney Araújo Leitão – Professor de Sociologia EBTT da UFAC

Brunno Freire Dantas de Oliveira – Ecólogo e pós-doutorando em University of California – Davis, USA

Thais de Nazaré Oliveira Novais – MestrandaPPG-CFT/INPA

José Henrique de Andrade Lima – PPGBA- UFPE

Maria Nazareth F. da Silva – Pesquisadora INPA

André Pereira Dias – CGMA/SEMA-MT

Davor Vrcibradic – Professor adjunto – UNIRIO

Adriana Ramos – ambientalista

Daniel Brandt Galvão – Professor IFCE

Pedro Bruzzi Lion – FUNATURA

Camila Julia Pacheco Ramos – Doutoranda PPG CFT/INPA

Lucirene Aguiar de Souza-Ufam

Deputado Federal Rodrigo Agostinho (PSB/SP) – Coordenador da Frente Parlamentar Ambientalista

Deputado Federal Nilto Tatto (PT/SP) – Coordenador da Frente Parlamentar Mista em Defesa dos ODSs

Carla Gheler-Costa – Bióloga, Dra.

Fábio Henrique Comin – Biólogo, Dr. 

Iris Roitman – Pesuisadora Colaboradora -UJ

Valério De Patta Pillar – Professor Titular, UFRGS

José Celso de Oliveira Malta – Pesquisador INPA

Annelyse Rosenthal Figueiredo – UFOPA

Elineide E. Marques – UFT

Rubens Harry Born – Engenheiro civil com especialização em engenharia ambiental, advogado, mestre e doutor em Saúde Pública

José Ribamar Bessa Freire –  Coordenação do Programa de Estudos dos Povos Indígenas da UERJ e pesquisador no Programa de Pós-Graduação em Memória Social da UNIRIO

Lucas Rodrigues de S. Santos – Doutorando em Ciência do France Rodrigues, PPGSOF/UFRR

Sistema Terrestre – Universidade da Califórnia Irvine, EUA

Gustavo T. Gazzinelli – jornalista e ambientalista e Belo Horizonte (MG)

Aurora Miho Yanai Nascimento – Pós-doutoranda/INPA

Beatriz Figueiredo Cabral – Mestranda PPG/CFT-INPA

Reinaldo Imbrozio Barbosa – Pesquisador do INPA/ Núcleo Roraima

Flávia Nogueira de Sá – Professora Universidade de Brasília

Célio U. Magalhães Filho – Pesquisador aposentado do INPA/ Pesquisador colaborador da FFCLRP/USP

Fatima Monteiro – Africultora Familiar FEATRAF AM 

Carol Monteiro – Agricultora Familiar CONTRAF BRASIL CUT

Rodrigo Guedes – Vereador CMM

Ana Karina Moreyra – Bióloga

Angela Galvão – Advogada

Miguel Scarcello

Renato Mattareli

Márcio Zikán Cardoso – Professor Associado UFRJ

Gabriela Borges Vedovello – Mestranda PPG/ECO INPA

Nathalia de Toledo Marinho – mestranda PPG ECO/INPA

Apoena Presidente Epitácio SP

Djalma Weffort

Debora Martins Nakayama 

Erika Berenguer – Pesquisadora University of Oxford/ Lancaster University/Rede Amazônia Sustentável

Wilson Roberto Spironello – Ecólogo – Pesquisador e líder do Grupo de Pesquisa de 

Mamíferos Amazônicos do INPA

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