Wednesday, November 13, 2019

Grilagem e desmatamento encontram “espaço” para avançar em áreas protegidas

por Danicley Aguiar

Redução de políticas de proteção à floresta e seus povos vem resultando em aumento das invasões e desmatamento ilegal, colocando em risco toda a Amazônia

Em 2019 o Brasil assistiu ao desmonte de importantes peças do sistema de proteção do meio ambiente. Mas o pior ainda está por vir, com a intensificação do ataque às áreas protegidas (AP), como Terras Indígenas (TIs) e Unidades de Conservação (UCs), que pode levar a Amazônia ao colapso. 
De janeiro a setembro deste ano, houve um aumento de 107% no número de focos de calor em Terras Indígenas, na comparação com o mesmo período de 2018, e alta de 76,3% no número de focos em UCs. De acordo com o Deter, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), no mesmo período deste ano foram detectados mais de 138 mil hectares (ha) com alertas de desmatamento em APs na Amazônia. Resultado direto da política antiambiental, que reduziu as fiscalizações, sabotou órgãos de controle e incentivou a crime.
Mosaicos de áreas protegidas impedem que o desmatamento avance.
Criados para conter o desmatamento da Amazônia na primeira metade dos anos 2000, o Mosaico de áreas protegidas da Terra do Meio e o Mosaico da BR 163, ambos no Pará, foram criados para evitar que o desmatamento avance para o norte da Amazônia, ao coração da floresta. Mas são hoje como um queijo suíço, alvos de uma intensa pressão, vinculada ao avanço permanente da fronteira agropecuária e, mais recentemente, à corrida garimpeira.
O maciço de áreas protegidas reúne uma variedade de unidades com diferentes níveis de proteção – de TIs a Áreas de Proteção Ambiental (APA) – a maioria delas ameaçada. Em sobrevoo realizado no auge da temporada de desmatamento e fogo deste ano na região, foi possível identificar que o avanço da fronteira agropecuária tem se traduzido na grilagem e no desmatamento das APs que compõem os mosaicos.
Invariavelmente associada à extração ilegal de madeira, pecuária e à especulação fundiária, a grilagem de terras constitui-se como a principal ameaça à integridade das APs da região, resultando num grave quadro de violência contra indígenas e extrativistas, fraude de documentos públicos, trabalho escravo e desmatamento.
Composto por 25 UC’s e 29 TI’s, os mosaicos protegem cerca de 37 milhões de hectares (ha) de floresta amazônica, mas vem sendo sistematicamente atacado por todos os lados.
Na região de São Félix do Xingu, a Estação Ecológica da Terra do Meio está sendo invadida por grileiros que, de agosto de 2018 a agosto de 2019, destruíram mais de 3 mil hectares de floresta, submetendo a Estação Ecológica aos efeitos da ampliação do rebanho bovino da região.
A Floresta Nacional do Jamanxim, na outra margem da BR 163, agoniza diante de um processo estruturado de grilagem e desmatamento, que já consumiu 13% da cobertura florestal original e esteve na base do chamado “dia do fogo”, uma ação coordenada de grileiros realizada entre os dias 9 e 11 de agosto, que fez subir de maneira assustadora o número de incêndios. Só em Novo Progresso foram registrados 358 focos de calor apenas nesses três dias. A unidade de conservação é uma das que encontra-se na mira dos ruralistas e do governo federal e foi a mais afetada pelas queimadas deste ano, perdendo 7.850 ha para o fogo.

O garimpo também avança, deixando um rastro de destruição que compromete o equilíbrio ecológico da região, especialmente dentro da terra indígena Munduruku, onde garimpos ilegais destruíram mais de 1.000 ha de floresta e poluíram pelo menos cinco importantes rios que banham o interior do território.
O que mudou no chão da floresta?
A ameaça contra a Amazônia e os povos da floresta não é de hoje. Mas desde o início de seu mandato, o governo Bolsonaro enfraqueceu as ações de fiscalização ambiental nos mosaicos e abandonou importantes instrumentos para a proteção da Amazônia, tal como o Plano de Combate ao Desmatamento da Amazônia, sinalizando perigosamente em favor daqueles que insistem em desprezar as leis que garantem a proteção das TIs e UCs na região, e que estão no comando de um processo que, desde a posse de Bolsonaro até setembro, já consumiu pelo menos 765,5 mil hea de floresta.
Em fevereiro, 21 dos 27 superintendentes do Ibama foram exonerados, deixando os escritórios parados. Em abril foi criado o Núcleo de Conciliação Ambiental, que visa “aliviar” as dívidas de desmatadores ilegais, enquanto o orçamento do Ibama foi cortado em 24% e o de combate ao fogo em 38%. 
Em maio, Bolsonaro anunciou planos de reduzir 67 Unidades de Conservação, para não atrapalhar a abertura de estradas e outros projetos. Salles promete rever todas as 334 Unidades de Conservação federais. Se considerarmos que Bolsonaro tem cumprido à risca as promessas assumidas com seus financiadores de campanha, devemos temer que o governo leve a cabo também esta ameaça. Não podemos permitir que isso aconteça.
Acompanhe a série de reportagens Amazônia sob ataque:

O que são Unidades de Conservação?
As unidades de conservação (UC) são espaços territoriais, incluindo seus recursos ambientais, com características naturais relevantes, que têm a função de assegurar a representatividade de amostras significativas e ecologicamente viáveis das diferentes populações, habitats e ecossistemas do território nacional e das águas jurisdicionais, preservando o patrimônio biológico existente.

As UC asseguram às populações tradicionais o uso sustentável dos recursos naturais de forma racional e ainda propiciam às comunidades do entorno o desenvolvimento de atividades econômicas sustentáveis.

Unidades de Proteção Integral:  o principal objetivo dessas unidades é a proteção da natureza, por isso as regras e normas são mais restritivas. Nesse grupo é permitido apenas o uso indireto dos recursos naturais, ou seja, aquele que não envolve consumo, coleta ou dano aos recursos naturais. 

As categorias de proteção integral são: estação ecológica, reserva biológica, parque, monumento natural e refúgio de vida silvestre. 

Unidades de Uso Sustentável: são áreas que visam conciliar a conservação da natureza com o uso sustentável dos recursos naturais. Nesse grupo, atividades que envolvem coleta e uso dos recursos naturais são permitidas, mas desde que praticadas de uma forma que a perenidade dos recursos ambientais renováveis e dos processos ecológicos esteja assegurada.

As categorias de uso sustentável são: área de relevante interesse ecológico, floresta nacional, reserva de fauna, reserva de desenvolvimento sustentável, reserva extrativista, área de proteção ambiental (APA) e reserva particular do patrimônio natural (RPPN).

Fonte:MMA


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