Thursday, November 14, 2019

Apagão em alto mar?

por Greenpeace Brasil

O monitoramento precário de petroleiros em nossa costa é reflexo da falta de recursos, informação, capacidade técnica e liderança do Estado brasileiro para enfrentar as consequências de um derramamento como o que tem afetado o Nordeste do país 

Fluxo de petroleiros na costa do Brasil no dia 12 de novembro – Fonte: Sentinel-1
Até 11 de novembro, 494 registros de óleo em praias, restingas e mangues já eram contabilizados em dez estados da costa brasileira, no que pode ser considerado o maior derramamento de óleo no planeta desde a explosão da plataforma Deepwater Horizon, no Golfo do México, em abril de 2010. As causas do vazamento ou sua origem ainda hoje permanecem desconhecidas, o que traz à tona outros problemas: a incapacidade do governo de fazer um monitoramento adequado dos petroleiros que cruzam os mares brasileiros e de de coibir uma prática criminosa que, ao que tudo indica, pode estar se tornando recorrente: a lavagem de tanques com  descargas de óleo em alto mar.
O exemplo mais claro desta falta de monitoramento foi a necessidade da Polícia Federal de receber ajuda de terceiros para chegar a uma lista de suspeitos. Porém, o caso segue em aberto e sem definição da origem do óleo e dos culpados do crime ambiental.
Atualmente, o fluxo de navios carregados de combustíveis fósseis destinados ao consumo interno e às exportações brasileiras ou de países vizinhos é enorme e sem controle. Para se ter uma ideia, nesta última terça-feira, 12 de novembro, 70 petroleiros navegavam pela costa do Brasil, entre o Amapá e o Espírito Santo, segundo imagens dataset de radar do Sentinel-1 (imagem acima).
Na última semana foram identificados dois casos de descarga irregular de óleo ou água oleosa feitas por navios na costa do Nordeste. Uma dessas descargas aconteceu no litoral potiguar e a outra, no paraibano. “É fato que estas duas descargas apenas não poderiam responder por todo o óleo que impacta as praias do litoral nordestino. Mas se torna necessário pesquisar mais em que frequência estas descargas tem acontecido. Isso pode ser feito gratuitamente utilizando as imagens de radar do sistema Sentinel e um dos sistemas de controle de tráfego de navios existentes”, diz Ricardo Baitelo, coordenador de Clima e Energia do Greenpeace.
Localização dos derramamentos de óleo na costa  do nordeste em julho de 2019
A primeira descarga aconteceu no dia 19 de julho,  próxima ao Parque Estadual Marinho de Areia Vermelha, localizado em frente à praia de Camboinha, no Município de Cabedelo (PB). Com uma extensão de 3 km, a  área do parque protege um extenso cordão recifal que margeia um banco de areia, o qual emerge somente durante a maré baixa e que dá nome à área de proteção. O parque foi criado pelo Governo do Estado da Paraíba com a finalidade de conservar a biodiversidade. Do total de espécies registradas na região, três são ameaçadas de extinção: Millepora alcicornis (hidrocoral); Echinaster (Othilia) echinophorus; e E. (O.) brasiliensis (estrelas-do-mar). “Elas podem ter sido expostas às descargas de óleo deste navio e sabem-se lá quantas outras mais”, diz Baitelo.
A segunda descarga aconteceu no dia 24 de julho. A mancha de óleo aparenta ter atingido 85 km de extensão sobre o mar, na altura do município de São Miguel do Gostoso, no Rio Grande do Norte. Bem no meio do rastro de óleo estão localizados bancos de corais como a Coroa das Lavadeiras, Urca da Cotia, São Miguel do Gostoso, Touros, Baixio da Cioba e Baixio do Cação.
Ambientes oceânicos ao redor dos recifes profundos da borda da plataforma continental, como os  recifes João da Cunha e adjacências, localizados em frente ao município de Areia Branca (RN) até a divisa com o Ceará, podem ter sido expostos a esta descarga. A região é considerada como detentora de um dos maiores recifes do norte do Brasil.
Em outubro, a SkyTruth, uma plataforma independente de sensoriamento e análise para monitorar ameaças ao meio ambiente por meio de imagens de satélite, já tinha identificado outra mancha de óleo nas águas brasileiras.
Apesar de o Estado brasileiro ter construído os instrumentos legais e ser provido de ferramentas dedicadas a prever e combater os impactos de um vazamento de petróleo no território – como o Plano Nacional de Contingência para Incidentes de Poluição por Óleo (PNC) e as Cartas de Sensibilidade Ambiental a Derramamentos de Óleo (Cartas SAO) – faltam recursos, equipamento, informação, capacidade técnica e liderança para enfrentar as consequências de um derramamento como o que tem afetado atualmente a costa do Nordeste brasileiro, com impactos para o meio ambiente, as pessoas e seu meio de vida.
É fundamental que o Estado realize um monitoramento amplo e coiba a prática de despejo de óleo no mar, com mais comando e controle. Este tipo de prática altamente poluidora é mais uma faceta de como os combustíveis fósseis, que têm origem em animais extintos, está nos aproximando da extinção. 


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