Sim,
elas estão te enganando: na tentativa de esticar seus lucros mantendo a
sobrevida dos combustíveis fósseis, as montadoras prejudicam a
concorrência e o combate às emissões de poluentes
Na semana passada o jornal alemão Spiegel denunciou que as
montadoras alemãs Volkswagen, Porche, Audi e BMW formaram um cartel,
desde os anos 1990, para acertar entre elas preços, fornecedores e tipo
de peças para os sistemas de tratamento dos gases poluidores dos seus
automóveis. Esses gases são oriundos da combustão dos combustíveis
fósseis e responsáveis pela poluição do ar que mata milhares de vidas
todos os anos nos centros urbanos. O acordo, claro, visava garantir o
menor investimento possível com tecnologias limpas, sem prejuízo com a
concorrência, afinal, todos os modelos de diferentes marcas oferecem o
mesmo padrão. O jornal ainda diz que no dia 4 de julho deste ano, a
Volkswagen admitiu em carta ao suposto cartel que tais procedimentos
seriam injustos com a competição. A notícia, em inglês, foi repercutida pela agência Reuters.
Em novembro do ano passado, ativistas fizeram uma projeção
na sede da Volkswagen, em Wolfsburg, na Alemanha: "Diga adeus ao
diesel".
Não é de hoje que fraudes atingem as grandes montadoras
alemãs. Em 2015, a Volkswagem foi indiciada por mascarar testes de
emissões de seus carros a diesel e acabou considerada culpada. A
descoberta de um cartel agora abre um novo triste capítulo na história
da indústria automotiva que, há décadas, se opõe a medidas de redução de
emissões e de ganho de eficiência. Ao contrário, elas enviam aos países
em desenvolvimento tecnologias já defasadas na Europa e EUA,
prolongando os elevados índices de poluição do transporte.
Em vários países desenvolvidos, no entanto, os escapamentos
já estão com os dias contados. Em 2025 a Noruega irá banir os carros à
diesel e gasolina – atualmente 24% da sua frota já é elétrica. Na França
e na Inglaterra, o ano para o fim desses veículos é 2040. A própria
alemã Volvo, que não foi citada como parte do cartel, anunciou que todos
os seus veículos terão motores elétricos a partir de 2019.
O Brasil na contramão
Na tentativa de alongar sua sobrevivência, o setor de
combustíveis fósseis se vale das táticas escusas, como cartel e muito
lobby político. No Brasil, essa influência ainda é forte o suficiente
para colocar nosso país na contramão do mundo: desde 2011 tramita na
Câmara dos Deputados um projeto de lei que propõe a liberação da venda
de veículos de passeio movidos a óleo diesel. O PL 1.013/2011 é uma
grave ameaça e não pode ser aceito pelo governo brasileiro.
Greenpeace protest against VW factory in Buenos Aires.
Activists filled up balloons with car emissions in order to return the
waste gases to the plant demanding "No more lies" (no mas mentiras),
“Stop poisoning our kids” (No contamines a nuestros hijos) a
Ativistas inflam balões com os gases tóxicos do escapamento de carros, em protesto na fábrica da Volkswagen.
O Brasil tem plenas condições de dar um passo importante para reduzir a poluição do diesel que, apenas na cidade de São Paulo, custará quase 200 mil vidas e R$ 54 bilhões em
gastos de saúde e perda de produtividade até 2050, se nada for feito. É
um dever dos governos federal, estaduais e municipais fazerem valer as
políticas ambientais do País e fomentar a transição para veículos que
utilizam combustíveis limpos. Tal medida trará benefícios para a
população e colocará o país em posição de vanguarda no mundo.
A primeira oportunidade para isso está nos ônibus do
transporte coletivo da capital paulista. A licitação de ônibus do
município de São Paulo acontece neste segundo semestre e ainda precisa
deixar claro o cronograma de descontinuidade do uso do diesel em
detrimento de combustíveis 100% renováveis - algo que a população se manifestou a favor. Mas
o lobby do gás natural e outras fontes ainda poluidoras, como o diesel
misturado com biodiesel, continua forte e tenta influenciar a pauta e as
decisões do poder público. O vereador Milton Leite (DEM) elaborou um
projeto para amarrar a cidade ao diesel por mais 20 anos! Esta transição
não pode esperar tanto tempo e deve ser prioridade para a Prefeitura,
que têm em suas mãos a possibilidade de fazer uma mudança histórica.
Davi Martins é coordenador da Campanha de Mobilidade Urbana do Greenpeace
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