Thursday, November 2, 2023

Cúpula das Três Bacias: passo importante para proteger florestas tropicais, mas faltou ação

Laís Modelli 

Apesar do importantíssimo objetivo de restaurar 350 milhões de hectares de florestas tropicais, o evento não se comprometeu com metas concretas nem garantia dos direitos dos povos indígenas. 

Floresta Amazônica em Rondônia. Em setembro, o Greenpeace Brasil realizou uma expedição de campo na Amazônia, passando por Porto Velho, em Rondônia, e Humaitá e Lábrea, no Amazonas, para registrar o avanço do desmatamento na região, o fogo e os impactos das queimadas.

Representantes dos países com as maiores florestas tropicais do mundo se encontraram na Cúpula das Três Bacias (a saber: bacias do Rio Amazonas, do Rio Congo e das Bacia de Bornéu-Mekong-Sudeste Asiático), na República Democrática do Congo, com o objetivo de implementar a primeira coligação mundial para restaurar 350 milhões de hectares de ecossistemas de florestas tropicais terrestres e aquáticos (Peatland e Mangues). Uma delegação do Greenpeace formada por representantes do Brasil, África e Indonésia acompanhou as conversações.

Apesar da importância e urgência do objetivo (conservar florestas tropicais e restaurar áreas degradadas é uma das ações centrais na luta para conter a atual crise climática), a declaração final da Cúpula das Três Bacias, publicada na terça-feira (31), não se compromete com ações concretas para a proteção e restauração das florestas tropicais, assim como não se compromete com a garantia dos direitos dos povos indígenas e das comunidades tradicionais.

Também chamou a atenção a falta de uma presença de peso do governo brasileiro na Cúpula, que busca retomar a liderança nos fóruns de discussões ambiental e climática e nas questões geopolíticas Sul-Sul. 

Floresta tropical em Bornéu, no Parque Nacional Tanjung Puting, na Indonésia.
© Ulet  Ifansasti / Greenpeace

Falsas soluções

Outro ponto de atenção da Cúpula das Três Bacias foram os controversos mercados de carbono, apresentados como o principal mecanismo financeiro para proteger e restaurar os ecossistemas de biodiversidade e as florestas tropicais. 

Diversas instituições e pesquisadores têm alertado que o mercado de carbono é uma falsa solução para a crise climática, pois reforçarão a mercantilização da natureza (e a sua destruição) e violarão os direitos de povos indígenas e comunidades tradicionais.

“O mercado de carbono, como está proposto, transforma a floresta em commodity e viola os direitos humanos. O financiamento do combate à crise climática e da perda de biodiversidade devem ser inovadores como proposto na declaração da Cúpula, tendo como características principais serem não mercadológicos, transparentes, acessíveis e previsíveis. Além disso, qualquer solução para conter os efeitos da crise climática deve reconhecer e privilegiar o papel das comunidades tradicionais e dos povos indígenas na proteção das florestas e garantir os seus direitos”, diz Romulo Batista, porta-voz de florestas tropicais do Greenpeace Brasil.

Povos indígenas e comunidades locais protegem mais de 75% das florestas no mundo, mas, até agora, o seu papel e conhecimento na conservação da natureza e da biodiversidade ainda não foram suficientemente reconhecidos.

Restauração dos ecossistemas já!

A Cúpula das Três Bacias ocorreu nos dias 26 a 28 de outubro. O evento acontece no âmbito da Década para a Restauração dos Ecossistemas, das Nações Unidas, que visa deter a degradação dos ecossistemas e restaurá-los para reverter o colapso da biodiversidade e desacelerar as mudanças climáticas. 

A atual década (2021-2030) é apontada pelos cientistas como a nossa última chance de evitar os efeitos catastróficos das mudanças climáticas. Ou seja, se quisermos evitar o pior, ainda há tempo, mas precisamos agir AGORA. O tempo está se esgotando. 

Por falar em tempo, estamos há um mês da COP28, a Cúpula do Clima da ONU, que será realizada em Dubai. O Greenpeace Brasil participará da COP28 e reforçará a urgência de regulamentar o financiamento climático global para que os países com menos recursos financeiros e tecnológicos – justamente os que menos contribuíram para a crise do clima e os que mais sofrem seus impactos hoje – possam se adaptar. Os efeitos negativos das mudanças climáticas não podem ser mais um fator para acentuar as desigualdades entre os países. Precisamos de Justiça Climática real, e não de falsas soluções que continuem privilegiando os mais ricos.

O navio Rainbow Warrior navega pelo Rio Amazonas pela primeira vez no Brasil, em março de 2012
O navio Rainbow Warrior, do Greenpeace, navega pelo Rio Amazonas pela primeira vez no Brasil, em março de 2012.
© Rodrigo Baleia / Greenpeace

sobre o(a) autor(a)

Laís é jornalista especializada na cobertura de temas relacionados à Amazônia e às negociações climáticas há quase dez anos. Rema e limpa praias nas horas vagas.

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