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Tuesday, February 21, 2017
Fotografia à serviço do meio ambiente
Postado por Rosana Villar
O premiado fotógrafo Daniel Beltrá veio ao Brasil para retratar a Costa do Amapá, em defesa dos Corais da Amazônia. Aproveitamos para bater um papo sobre ativismo, conservação ambiental e, claro, fotografia.
O Parque Nacional do Cabo Orange é um dos mais importantes locais para aves, como flamingos e guarás (foto), e mais de 400 espécies avistadas em áreas alagadas, mangues e áreas costeiras. (Foto: © Daniel Beltrá /Greenpeace)
Dono de uma coleção considerável de prêmios, Daniel Beltrá especializou-se em retratar as belezas e mazelas ambientais ao redor do mundo e considera-se antes de tudo um ambientalista, que encontrou na fotografia uma forma de expressar sua paixão e luta pelo meio ambiente.
O fotógrafo, que tem longa parceria com o Greenpeace – já se vão 25 anos de história – esteve no Brasil à convite da campanha Defenda os Corais da Amazônia, para registrar a natureza exuberante do estado do Amapá, que tem sua preservação comprometida pela iminência do petróleo em sua costa.
A exploração de petróleo no Amapá oferece riscos não apenas aos recifes de corais na região da foz do Rio Amazonas, mas também às populações tradicionais de cidades litorâneas e de ecossistemas sensíveis, como os mangues, que dependem do mar e das marés para existir.
>> Confira as primeiras imagens dos Corais da Amazônia vistos debaixo d'água
Uma grande barragem foi construída no Amapá, destruindo centenas de quilômetros quadrados de floresta. Muitas pequenas e médias barragens ainda estão planejadas. A energia gerada por elas vai para as grandes cidades. A população local tem pouco acesso a eletricidade. (Foto: © Daniel Beltrá /Greenpeace)
Nascido em Madri, na Espanha, e radicado em Seattle, nos Estados Unidos, Daniel tem quase sempre como modelo sua grande musa inspiradora, a Natureza. Uma paixão antiga, dos tempos em que estudava biologia, antes de tornar-se fotógrafo profissional quase que por acidente.
Através de suas lentes já passaram as curvas gélidas do Ártico à Antártida, rios e florestas amazônicas e tragédias inesquecíveis, como o desastre do Golfo do México. Trabalhos reconhecidos por dois Word Press Photos, dois prêmios do Museu de História Natural de Londres, um BBVA Foundation award, entre dezenas de outros, por sua importância na luta pela proteção do meio ambiente.
Em sua passagem pelo Brasil batemos um papo com Daniel sobre ativismo, conservação ambiental no mundo de hoje e, claro, fotografia. Confira.
Há quanto tempo você colabora com Greenpeace?
A primeira vez que estive com o Greenpeace foi em 1990. Tinha ido como convidado, estava pela Agência Espanhola de Notícias (EFE) no navio Sirius, no Mediterrâneo. Fomos fazer um monitoramento de mamíferos marinhos. Mas o primeiro trabalho que fiz como contratado pelo Greenpeace foi em novembro de 1992. Um barco quebrou na costa da Galícia, na Espanha, e houve um grande derramamento de óleo. Foi curioso, porque quando eles me ligaram para saber se eu queria ir, eu já estava no aeroporto indo. Iria de qualquer jeito.
Qual foi a atividade com o Greenpeace que mais te marcou até hoje?
A ida à Mururoa, uma ilha na Polinésia Francesa, onde a França fazia testes nucleares. Lá havia uma base militar francesa. Fomos até o local para fazer os registros em dois navios, o Vega e o Rainbow Warrior II, saímos do Panamá. Quando estávamos realizando a ação, a marinha francesa chegou e tivemos que nos apressar, mas consegui esconder os filmes das máquinas antes de nos prenderem. Três dias depois fomos soltos pela polícia e um amigo que trabalhava na Reuters me ajudou a transmitir umas cinco fotos – que acabaram nas capas de todos os jornais no dia seguinte. No final, queriam me expulsar da Polinésia, mas consegui sair antes. Houve uma revolta nacional, as pessoas fizeram manifestações no aeroporto, queimaram edifícios, a população local se revoltou totalmente contra os franceses que estavam fazendo os testes nucleares e um ano depois a França decidiu não fazer testes lá nunca mais. Gosto de pensar que o que fizemos foi importante nesse sentido, que há uma transcendência. E também gosto de lembrar da ação e da aventura, pois foi uma aventura incrível.
Água poluída de uma mina. Isso é agora um problema crônico na região, com altos e perigosos níveis de mercúrio encontrados a milhares de milhas das minas, afetando inclusive os peixes. (Foto: © Daniel Beltrá /Greenpeace)
Qual o objetivo desta sua viagem ao Brasil?
Vim pela campanha Defenda os Corais da Amazônia, mas não para fotografar os corais diretamente. Tenho bastante experiência na Amazônia. Estou registrando a região que poderia ser impactada em caso de um vazamento de petróleo e sei bem o que pode acontecer [Beltrá ganhou o Veolia Environnement Wildlife Photographer of the Year em 2011 com uma foto de pelicanos cobertos de óleo após o desastre na plataforma Deepwater Horizon, no Golfo do México, em 2010, operada pela BP, a mesma empresa que planeja explorar petróleo próximo aos corais da Amazônia].
Qual atividade mais te marcou aqui no Brasil?
Não posso falar de uma particular. Mas, em geral, a destruição da floresta é algo que me marca muito. Lembro das primeiras vezes sobrevoei a Amazônia, de ver as queimadas, as vezes milhares de focos em um dia. Uma vez, voando de Manaus para Brasília a noite, contei mais de cem focos. É muito impressionante, o tamanho da destruição. Mas, por outro lado, no norte da fronteira você vê aquela floresta densa, muito rica e protegida.
Você se especializou no registro fotográfico de natureza e questões ambientais, por que?
Desde muito pequeno sempre fui um apaixonado pela natureza, saía muito para o campo, pegava todos os bichos que encontrava em minha casa, guardava sementes. Na época da universidade, comecei a estudar engenharia florestal e depois passei em Biologia, mas o que eu gostava de verdade era defender a natureza, porque quando você gosta muito de uma coisa você quer lutar para preservá-la. Na fotografia encontrei uma ferramenta muito boa para isso.
Como?
Primeiro, porque com a fotografia você converte as pessoas em testemunhas de coisas que são muito difíceis de se imaginar. Se você fala de desmatamento da Amazônia algumas pessoas terão dificuldade de compreender o tamanho do problema, mas se você vê as fotos aéreas, é muito impressionante. Não tem como ficar insensível a isso. Segundo porque com a fotografia consigo ajudar a traduzir um pouco da ciência para o grande público. Quando você fala de aquecimento global, há coisas que são difíceis de entender, mas através da fotografia podemos contar essa história.
Áreas inundadas próximas à foz do Rio Amazonas e do Rio Araguari. A campanha Defenda os Corais da Amazônia quer evitar que empresas explorem petróleo em uma região oceânica na foz do Rio Amazonas. (Foto: © Daniel Beltrá /Greenpeace)
Você se considera um ativista ambiental?
Sim. Gosto muito da fotografia, mas costumo dizer que sou apenas um ativista com uma câmera. A câmera é o meio que utilizo, mas acho que mostrar o está acontecendo atualmente com o mundo é mais importante que a própria fotografia.
Você tem acompanhado as questões ambientais há quase 30 anos e pôde testemunhar diversos erros e acertos da humanidade neste sentido. A partir dessa sua vivência, que caminho você acha que o mundo está seguindo?
Acho que o mundo está indo por um caminho muito ruim. Sou otimista por natureza, há muitas pessoas fazendo trabalhos bons pela preservação ambiental. Mas não sei o que pode acontecer. Busco acreditar que temos o poder de alcançar o que quisermos e que, se decidirmos mudar as coisas, podemos mudá-las de verdade. É como se você estivesse num barquinho sem remos no meio do mar, com uma praia bem distante. Você vai ficar lá esperando ou vai nadar o máximo que puder para chegar até a praia? Se o mundo anda mal, se está tudo ruim, você vai ficar apenas esperando sem fazer nada? Mudar o jogo é algo que depende de nós.
Como foi seu começo na fotografia?
Eu fazia algumas fotos porque gostava, mas nunca tinha trabalhado com foto. Um dia, estava na minha casa, e o ETA, um grupo terrorista da Espanha, explodiu uma bomba na embaixada norte americana em Madri. Estava tomando banho em casa quando ouvi no rádio, o locutor disse "explodiram uma bomba, temos poucas informações, se você sabe o que está havendo, ligue para a agente", e eu resolvi pegar minha câmera e ir lá dar uma olhada. Peguei meu carro, cheguei rápido, a rua ainda não estava fechada, então tirei várias fotos e pronto. Daí fui para a EFE, a agência de notícias espanhola, e alguém da equipe de fotografia que estava de plantão naquela noite disse que não tinha interesse porque já havia mandado uma equipe para o local. Eu já estava saindo pelo corredor, triste, quando um cara me chamou e disse "hey, garoto, o que você disse que tem aí?" Falei que eram as fotos da bomba, então o cara, que era o técnico do laboratório, pegou o filme para revelar. Assim que ele viu o material ligou para o editor e disse "chega amanhã mais cedo, quero que você conheça alguém". Assim consegui meu primeiro emprego como fotógrafo.
Cerca de 1 bilhão de toneladas de lama e de sedimentos são levados dos Andes para a Amazônia a cada ano, formando ou criando planícies de inundação – ou chegando ao mar pela "pluma" do rio. (Foto: © Daniel Beltrá /Greenpeace)
Você acha que fotografia é mais sorte, técnica ou talento?
Como tudo na vida, é trabalho duro e um pouquinho de todo o resto. É bom ter técnica, mas não é o mais importante. Hoje em dia complicamos muito a fotografia. As pessoas se preocupam muito mais com todas as mil opções que as câmeras têm, enquanto deveriam estar mais concentrados no que estão olhando através do pequeno quadrado. Eu tive a sorte de começar na fotografia em outra época, as câmeras eram bem mais simples, você se preocupava com a luz, duas ou três coisas na câmera e só. Hoje algumas pessoas se preocupam tanto em regular as configurações da câmera que se esquecem da composição. Para as pessoas que estão começando, eu digo sempre que é preciso trabalho duro e insistência. Digo para buscarem temas perto de casa, para que você possa trabalhar com regularidade, e ser um editor critico consigo mesmo. Pois se você não e critico, alguém vai ser.
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