Em apenas dez dias, o estado do Amazonas atingiu a máxima histórica de 2.684 focos de calor, enquanto todo o mês de outubro do ano passado registrou 1.503
Segundo dados do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), publicados nesta terça-feira (10), o estado do Amazonas atingiu 2.684 focos de calor na Amazônia em apenas dez dias. O número registrado nesse curto período já supera a máxima registrada em toda a série histórica para o mês de outubro no estado.
Até o momento, os municípios de Lábrea (344 focos de calor), Boca do Acre (263), ambos no sul do estado, e Novo Aripuanã (245) lideram o número de queimadas na Amazônia representando 32% do total de incêndios no estado. Como efeito imediato do crime, muitas cidades do estado e suas populações vêm sufocando com a fumaça das queimadas há mais de dois meses. Na manhã desta quarta-feira (11) a qualidade do ar da capital Manaus foi considerada pelo painel World’s Air Polution como a segunda pior do mundo.
A situação enfrentada pelo estado hoje é resultado da combinação de uma série de fatores. Este ano, o verão amazônico, quando o clima mais seco favorece a ação de criminosos para o desmatamento e as queimadas, foi potencializado pelo fenômeno climático El Niño, causado pelo aumento das temperaturas do oceano Pacífico, e por um clima ainda mais quente que o normal. Se não bastasse tudo isso, a falta de ações estruturantes por parte do governo do estado contribuiu para o aumento das queimadas na região.
“A seca na região Norte do país já está causando impactos severos na vida e saúde das comunidades locais e na biodiversidade. Mesmo com a redução dos alertas de desmatamento em 48% nos primeiros nove meses do ano na Amazônia e da redução de 64% no Amazonas, estamos longe de reverter a lógica da destruição na região”, afirma Thaís Bannwart, da campanha de Amazônia do Greenpeace.
“Para além de ações emergenciais, cruciais neste momento, precisamos que o governador Wilson Lima avance em ações e programas que induzam a uma nova lógica econômica que concilie a floresta em pé com geração de renda para os moradores do interior, além da criação de Unidades de Conservação e demarcação de territórios tradicionais, a regularização ambiental e o amplo apoio às ações dos órgãos de fiscalização à punição dos criminosos que destroem a Amazônia, algo que o governador não fez em seu primeiro mandato”, completa.
Escalada da destruição
De acordo com dados do sistema Prodes, do Inpe, em 2018 o Amazonas ocupava a 4º posição entre os estados que mais desmatavam na Amazônia. Isso começou a mudar em 2019, primeiro ano da dobradinha Wilson Lima (UNIÃO)/Bolsonaro, quando o estado passou para a 3º posição e, em 2021, o Amazonas superou definitivamente o Mato Grosso (que ocupou por muitos anos o segundo lugar) e passou a ser o 2º estado que mais desmata no bioma, posição que ocupa até hoje.
De lá para cá, a gestão estadual, reeleita, foi reafirmando seu compromisso com o legado antiambiental dos últimos quatro anos, e chegou a utilizar politicamente a estiagem extrema que penaliza a população para tentar avançar na marra com o controverso projeto de asfaltamento da BR-319, que liga o arco do desmatamento, e uma das fronteiras mais ativas e ferozes do desmatamento no momento, ao coração da Amazônia. Projeto que segue travado, pois os governos interessados se negam a cumprir as recomendações de mitigação de riscos e as consultas às populações afetadas.
Inclusive, é justamente na área de influência da rodovia, no sul do Amazonas, que se concentram os maiores índices de desmatamento do estado. Em 2020, cerca de 21.600 hectares de florestas foram desmatados na região da BR-319, em 2021 subiu para 45.300 hectares, mais que o dobro do ano anterior, e em 2022 alcançou o total de 48.000 hectares, segundo dados do Inpe.
Uma nota técnica publicada pelo Observatório da BR-319, em julho deste ano (Abertura e expansão de ramais em quatro municípios sob influência da rodovia BR-319), mostra que a extensão de ramais irregulares abertos a partir da rodovia em quatro municípios do sul do Amazonas (Canutama, Humaitá, Manicoré e Tapauá) já é seis vezes maior que a própria BR. Outra nota técnica publicada recentemente pela organização aponta que dos 5.092 quilômetros (km) de ramais abertos nesses municípios, 55% estão concentrados em Florestas Públicas Não Destinadas (FPND).
Para a engenheira florestal Tayane Carvalho, autora da segunda nota, os ativos ambientais presentes nas FPND do sul do Amazonas são um grande atrativo para grileiros e desmatadores. “Esse elemento atrativo vem fazendo com que muitos infratores ambientais migrem para essa região visando a extração ilegal de madeira, o desmatamento e a posterior introdução de gado e grilagem terras, processos de ilegalidade que são facilitados pela abertura de ramais”, afirma. É um prato cheio para a destruição, e sem que o poder público aja para evitar isso.
Carta aos governadores
Em agosto deste ano o Greenpeace Brasil publicou uma carta aberta aos governadores dos nove estados amazônicos que compõem o Consórcio Amazônia Legal: Acre, Amapá, Amazonas, Mato Grosso, Maranhão, Pará, Rondônia, Roraima e Tocantins, pedindo a adoção de medidas urgentes para zerar o desmatamento até 2030, como a validação de todos os Cadastros Ambientais Rurais (CAR) da região.
“Esse aumento dos focos de calor no Amazonas é o agravamento do incentivo por parte do governo estadual na destruição das florestas. Não adianta o governador Wilson Lima decretar emergência devido às secas que afetam a população e a biodiversidade, se a sua política defende a mineração em território indígena, e se coloca ao lado de pecuaristas punidos pelo IBAMA no sul do estado”, finaliza Thais.
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