Cristiane Mazzetti e Rosana Villar
No Dia Internacional da Diversidade Biológica, reforçamos porque a biodiversidade é importante em nossas vidas e como o Brasil, refém da destruição, tem fomentado essa crise
“Viver em harmonia com a natureza”. Essa sentença, aparentemente simples, é a visão traçada pela convenção das Nações Unidas que discute biodiversidade, a ser atingida até 2050. Um desafio que, de simples, não tem nada. Mas que o mundo precisa encarar, mudando radicalmente a forma como nos relacionamos com a natureza, em particular no Brasil, que abriga uma biodiversidade abundante e que vem sendo colocada diariamente em risco.
Atualmente, cerca de 1 milhão de espécies no planeta estão em processo de extinção, uma verdadeira crise na biodiversidade global, que se soma a outras crises que já enfrentamos, como a emergência climática e a pandemia de Covid-19. É o planeta dando sinais de exaustão.
A humanidade já ultrapassou quatro, dos nove limites planetários que viabilizam a vida na Terra. Um desses limites, já parcialmente excedido, é o da integridade da biosfera, que diz respeito à diversidade genética que é importante na adaptação do planeta à mudanças abruptas. E uma vez superados esses limites, isso pode levar a mudanças irreversíveis para todos.
O desmatamento e a degradação das nossas florestas é a ação humana que mais impacta a biodiversidade terrestre, pois remove o habitat das espécies. A expansão de monoculturas regadas à agrotóxicos também tem impactos significativos, pois reduz a diversidade genética das plantas, além de impactar a biodiversidade contida nos solos e os insetos polinizadores.
O Brasil, campeão de desmatamento e de uso de agrotóxicos e que tem
passado por um desmonte dos mecanismos de proteção ambiental, tem,
segundo o Livro Vermelho da
Fauna Brasileira Ameaçada de Extinção do Instituto Chico Mendes de
Conservação da Biodiversidade de 2018, 1.172 espécies ameaçadas de
extinção, sendo que 50% delas estão na Mata Atlântica, onde restam hoje
menos de 10% da vegetação natural.
Sem contar as espécies que podem estar em risco de extinção e que a ciência ainda desconhece. Um estudo estima que cerca de 10% das espécies ainda desconhecidas de vertebrados estejam no Brasil. O risco para a biodiversidade brasileira, portanto, é real e cada vez maior: em 2020 a taxa de desmatamento da Amazônia, medida pelo Prodes, do Inpe, foi a maior desde 2008.
Já o sistema Deter, também administrado pelo Inpe, vem apontando para uma forte tendência de alta do desmatamento em 2021, com abril batendo o recorde de alertas da série histórica do Deter-B para o mês, com 58 mil hectares. A destruição está avançando e precisa ser parada, antes que seja tarde.
A biodiversidade em nossas vidas
A biodiversidade em interação com o ambiente gera uma série de serviços ambientais, que não podemos perder. O armazenamento de carbono nas florestas tropicais – que as tornam excelentes aliadas no combate às mudanças climáticas -, por exemplo, funciona graças ao enorme número de árvores, que por sua vez só se estabelecem por causa dos animais que comem seus frutos e espalham as sementes para que novas árvores cresçam.
Uma vez que a população de animais é reduzida ou extinta, a
capacidade dessas árvores se estabelecerem também se perde. E o que
vemos daí em diante, são perdas em uma cadeia infinita. Pois a verdade é
que estamos todos conectados e a diversidade biológica é o que nos
mantém seguros, inclusive contra novas pandemias.
Outro exemplo está na polinização das plantas. Um levantamento mostrou que a polinização animal contribuiu com R$ 43 bilhões em benefícios para os agricultores brasileiros.
Sem ela, a produção agrícola e de alimentos fica prejudicada. O que os
alertas da ciência têm dito é que, em um futuro próximo, a fome poderá
ser agravada também pela crise da biodiversidade.
E o Brasil com isso?
O Brasil possui uma das maiores biodiversidades do mundo e é guardião da maior floresta tropical úmida do planeta. Mas o atual modelo de produção de commodities, em expansão desenfreada no Brasil e nutrido frequentemente por desmatamento e uso exacerbado de insumos químicos (agrotóxicos e fertilizantes), tem colocado a biodiversidade em risco.
Além disso, nos últimos anos o padrão do governo brasileiro, em empreitada conjunta com parlamentares ruralistas, têm sido favorecer o lucro de poucos, em detrimento do bem estar de todos.
Estímulos à grilagem estão em discussão no Congresso Nacional em dois Projetos de Lei (PL2633/2020 e PL510/2021), que anistiam a invasão de terras públicas e incentivam novos desmatamentos. Hoje são mais de 50 milhões de hectares de florestas ainda não destinadas na mira da grilagem, com crescente desmatamento nessas áreas.
Houve também aprovação na Câmara dos Deputados, sem discussão com a
sociedade, de um projeto (PL3729/2004) que muda as regras do
licenciamento ambiental, permitindo que obras de infraestrutura e
grandes projetos de agricultura industrial, por exemplo, sejam
instalados sem os devidos estudos e cuidados, sem contar o libera geral
de agrotóxicos: foram 1.165 agrotóxicos liberados nos últimos dois anos e
meio.
Enquanto isso, do outro lado da trincheira, as instituições de proteção e controle do desmatamento são desmanteladas, com suas atuações sufocadas pela falta de orçamento e autonomia. A ciência também tem sido deixada à míngua, com cortes volumosos nos recursos para subsidiar a pesquisa científica.
Uma notícia péssima para um país que tem tanto potencial para desenvolver pesquisas. Com a pandemia, fica ainda mais claro como a ciência é importante.
Nosso papel nessa história
Proteger a biodiversidade não se trata apenas de defender a
natureza. É defender toda a vida, inclusive a nossa, pois fazemos parte
da biodiversidade. Vivemos um momento chave: ou mudamos nossa relação
com a natureza ou nosso bem estar e o bem estar dos nossos filhos
estarão comprometidos.
Para alcançar aquele estado de “viver em harmonia com a natureza”, como recomenda a ONU, precisamos, primeiramente, cessar a perda de habitats, ou seja, alcançar o Desmatamento ZERO no Brasil. Cadeias produtivas e investidores que ainda nutrem o desmatamento precisam parar de fazê-lo, imediatamente.
O Brasil precisa investir mais em pesquisa, ouvir mais a ciência. Também é urgente fazer uma transição no modelo alimentar, de maneira a favorecer a produção de comida de verdade e demais alternativas econômicas que respeitem a vida, a biodiversidade, e mantenham nossas florestas em pé, vivas.
Frear propostas que reduzem a proteção ambiental, retomando esforços de fiscalização, a criação de novas Unidades de Conservação e demarcação de Terras Indígenas, além de proteger as que já existem, são pontos fundamentais.
Se o governo Bolsonaro insiste em ignorar a urgência que vivemos, a sociedade precisa insistir nessa defesa. É sobre a vida de todos na Terra.
Que bom que você leu até o final! Você, que é a favor da proteção da Amazônia e seus povos, do enfrentamento da crise climática e de uma alimentação sem veneno, saiba que as florestas, os compromissos climáticos e a saúde da população estão mais ameaçados do que nunca por um esquema articulado de destruição. Descubra aqui quem é quem na devastação do meio ambiente e ajude a combatê-los. É hora de nos mobilizarmos para, juntos, frearmos os retrocessos ambientais.
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