Carol Marçal
Os desafios que os Munduruku enfrentam em seu próprio território, no Pará, revelam um cenário que poderá se proliferar pela Amazônia se os planos do governo Bolsonaro se consolidarem
Os planos do governo Bolsonaro e da bancada ruralista no Congresso, de abrir os territórios indígenas para o avanço do capital privado usando como estratégica o ataque aos direitos indígenas e o divisionismo entre os povos, já são bastante nítidos. Infelizmente, o que temos visto no território do povo Munduruku, no Pará, no último mês, revela o cenário que se proliferará sobre toda a Amazônia se esses planos se consolidarem.
As cenas são de terror e parecem vindas de um filme distópico. Dentro de territórios indígenas vimos casas sendo incendiadas, lideranças ameaçadas e armas de fogo sendo ostentadas por criminosos que contam com a garantia de impunidade, fator determinante para o aumento e a perpetuação da violência no campo. Esse cenário é uma pequena dose do futuro desesperador que nos aguarda caso o trator ruralista que destrói a Amazônia e tira direitos da população não seja, efetivamente, freado.
São muitas as propostas de desmonte das políticas socioambientais que buscam entregar os territórios indígenas para a expansão de um modelo de desenvolvimento que é ambientalmente predatório e socialmente excludente, a exemplo do Projeto de Lei (PL) 191/2020 e do PL 490/2007. Na prática, eles obrigarão os povos indígenas a abrir mão de seu modo de vida ancestral. As medidas também inviabilizarão a demarcação das mais de 800 terras indígenas ainda não reconhecidas pelo Estado brasileiro.
Os ataques garimpeiros a lideranças do povo Munduruku, que incansavelmente lutam para proteger seu território, modo de vida e cultura, vêm acontecendo repetidamente ao longo deste ano e são um reflexo direto da política anti-ambiental e anti-indígena do governo Bolsonaro. Em março, a sede da Associação Wakoborun, associação de mulheres indígenas contrárias à mineração em terra indígena, foi destruída por garimpeiros no município de Jacareacanga, onde se localizam as terras indígenas Munduruku e Sai Cinza, no Alto Rio Tapajós. No último dia 26, Maria Leusa Kaba, e sua mãe, Cacica Isaura tiveram suas casas queimadas por garimpeiros ilegais na Aldeia Fazenda após uma operação da Polícia Federal (PF) contra o garimpo ilegal, também na região de Jacareanga, epicentro do ouro ilegal no Brasil. Basta! A escalada da violência é inaceitável.
A Operação Mundurukânia 2, realizada pela Polícia Federal essa semana, é um desdobramento da investigação que identificou a atuação de uma organização criminosa na extração de ouro naquela região. As ações também são consequência de uma decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), que determinou ao governo federal a adoção imediata de todas as medidas necessárias à proteção da vida, saúde e segurança dos povos Munduruku e Yanomami, (em Roraima) ambos vivendo um trágico avanço de grupos criminosos que extraem ouro ilegal em seus territórios.
Em meio à situação alarmante, a Justiça, a pedido do Ministério Público Federal (MPF), também ordenou que o governo federal proteja os indígenas sob ataque de garimpeiros no Pará.
Diante de tanta omissão e da ascensão das violências e violações às vidas e aos territórios indígenas, delegações de indígenas chegaram a Brasília no dia 8 de junho para denunciarem as políticas anti-indígenas do governo Bolsonaro e da bancada ruralista. Ontem (17), após três dias de viagens, enfrentando as ameaças dos garimpeiros que tentaram impedi-los, e sob escolta policial, mais 85 lideranças Munduruku se somaram ao Acampamento “Levante Pela Terra” em defesa de seus direitos territoriais.
Não podemos normalizar a violência contra os povos originários e nem permitir uma política genocida que nos remete ao nosso passado colonial. Exija a proteção imediata da vida dos povos indígenas e de seus territórios, assim como a retirada de todo o pacote de destruição ambiental atualmente em pauta no Congresso Nacional.
Reafirmar os modos de vida tradicionais como alternativa à economia da destruição é nosso único caminho.
Desde 2018, o Greenpeace, juntamente com outros parceiros, vem realizando um projeto focado na proteção territorial. O “Todos os Olhos na Amazônia” tem como objetivo estimular a ação em rede como estratégia para apoiar a luta de povos indígenas e comunidades tradicionais pela conservação das florestas e de seus territórios tradicionais.
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