Saturday, January 2, 2021

Senadores, a solução é vender o Brasil?

Greenpeace Brasil  

Com apoio do governo, Senado aprova a facilitação da venda de terras brasileiras a estrangeiros

Área de cultivo de soja no Condomínio Estrondo, no oeste da Bahia
Facilitar a pressão estrangeira por terras brasileiras pode aumentar a especulação fundiária e a pressão da fronteira agrícola nas florestas do Brasil, além de prejudicar a agricultura familiar no país © Victor Moriyama / Greenpeace

O Senado Federal aprovou ontem à noite o Projeto de Lei do Senado (PLS 2.963/2019)

, de autoria do senador e ruralista Irajá Abreu (PSD/TO), que determina regras menos restritivas para a aquisição, posse e o cadastro de terras brasileiras por pessoa física ou jurídica estrangeira. 

Além da péssima hora – em meio à maior taxa de desmatamento dos últimos 12 anos, impulsionada pela especulação imobiliária e pela grilagem de terras – o projeto foi votado sem qualquer debate, transparência e participação da sociedade.  Em tramitação no Senado, o projeto ainda aguardava audiência pública com especialistas e análise pela Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ) para, só então, ir a plenário. 

Mas, de maneira vergonhosa, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre, de um dia para o outro, aceitou atropelar as etapas e incluir o projeto para votação diretamente pelo plenário. O texto, que sequer havia sido disponibilizado para conhecimento da sociedade, foi aprovado rapidamente, em votação simbólica. 

“Ao votar um tema de tamanha complexidade e importância para a população brasileira, a toque de caixa em um projeto repleto de problemas graves, os senadores colocam em risco a participação social, o meio ambiente e a nossa segurança alimentar”, afirma Mariana Mota, Coordenadora de Políticas Públicas do Greenpeace. “Para aqueles que deveriam defender a soberania do Brasil e da Amazônia, maior contradição não há.” 

Hoje já é permitida a aquisição de terras por estrangeiros, mas com limitações, justamente para garantir segurança para a população brasileira. A legislação em vigor (Lei 5.709/1971), contudo, vinha sendo questionada há alguns anos e regulada, em última instância, por um parecer da Advocacia-Geral da União (AGU), de 2010, que mantinha a visão da lei num caráter mais restritivo para venda de terras brasileiras a estrangeiros. O ponto mais crítico de revogar a Lei de 1971 é deixar de valer seu artigo 1º, que diferencia ‘empresa brasileira’ de ‘empresa brasileira com capital estrangeiro e sede no exterior’, esta última estando submetida a regras para aquisição de terras no Brasil, já que a lei entende essas empresas brasileiras como figuras estrangeiras. Assim, ao revogar a lei atual, o projeto está dizendo que uma empresa controlada por estrangeiro pode comprar terras no Brasil sem nenhuma regra. O projeto estende, ainda, a dispensa de qualquer autorização ou licença para aquisição de terras por estrangeiros de áreas no Brasil até 15 módulos fiscais. Na Amazônia, 15 módulos fiscais podem chegar a até 1.650 hectares. O projeto, agora, segue tramitação para ser apreciado pela Câmara dos Deputados. 

O que o Brasil pode perder

Facilitar tais critérios e estimular a pressão estrangeira sobre as terras brasileiras leva ao aumento da insegurança alimentar, da especulação fundiária, do avanço da fronteira agrícola sobre as florestas, da grilagem e das disputas – não raras, violentas, – por terra. Isso porque, em primeiro lugar, esse cenário aumenta a valorização e o preço da terra agricultável no país, gerando mais pressão para a aquisição de novas áreas, inclusive a invasão de terras públicas, e menos estímulos a políticas para criação de áreas protegidas, como unidades de conservação e terras indígenas, o que poderá levar a ainda mais desmatamento e disputa violenta por terras

Esse cenário pode, ainda, gerar um descontrole da quantidade de terras que passem a produzir apenas commodities para atender o mercado global, já que não há garantias de que os novos donos da terra não irão produzir apenas produtos para fins de exportação, como a soja. Mais terras produzindo commodities para exportação significam menos terras para a produção de comida de verdade para a mesa dos brasileiros. Hoje, cerca de 70% dos alimentos consumidos no Brasil são produzidos pela agricultura familiar, que será extremamente fragilizada com a aprovação dessa matéria. 

“Toda essa pressão no país, que já enfrenta sérias desigualdades e concentrações de renda e terras, pode levar à inviabilidade mercadológica de pequenos e médios agricultores, com impacto na produção e preço de alimentos, levando prejuízos diretos ao prato da população”, conclui Mota.

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