Juristas se reúnem no Senado para discutir as falhas do Código Florestal (foto: Agência Senado)
Em mais um capítulo da discussão do Código Florestal, cinco importantes juristas brasileiros foram ouvidos hoje no Senado para debater e apontar falhas jurídicas do projeto de lei aprovado na Câmara em maio.
E põe falhas nisso.
Um dos primeiros a falar, o subprocurador-geral da República Mário José Gisi lembrou que os senadores precisam considerar na discussão da matéria os compromissos internacionais que o Brasil assumiu. “Enquanto o país se compromete com metas para o combate às mudanças climáticas, o Senado está discutindo a possibilidade de provocar uma onda de desmatamento e emissões incontroláveis de carbono”, disse. “Não podemos andar no sentido contrário aos compromissos assumidos”.
Além de se posicionar contra a intervenção ou supressão de Áreas de Proteção Permanente e a recomposição de Reserva Legal com espécies exóticas, Gisi foi ácido ao falar sobre a anistia a desmatadores. “Quem cumpriu a lei se sentirá um trouxa, essa é a palavra exata”. O subprocurador ainda apontou que "a figura disposta no texto sobre área rural consolidada é uma afronta à sociedade".
Também presente na audiência, a promotora do Ministério Público de São Paulo, Cristina Godoy, chamou a atenção para a vulnerabilidade que o Código trará para as florestas, caso seja aprovado. “Do jeito que está, o texto permite que determinadas áreas, como topos de morro, tenham suas áreas de proteção diminuídas em até 99%”, afirmou. “Esse e outros dispositivos preocupantes que constam no relatório contrariam o artigo 225 da constituição, que salvaguarda os processos ecológicos essenciais”.
Em sua fala, o ministro do Superior Tribunal e Justiça Herman Benjamin lembrou de uma relevante parte da discussão no Código Florestal: a importância de diferenciar os pequenos dos grandes proprietários. “A própria Constituição Federal, no artigo primeiro, faz a diferenciação, portanto os senadores não precisam temer fazer o mesmo também no Código. Não dá para dar mesmo o tratamento a quem desmatou com correntão e aos pequenos produtores”.
Estado ou União?
Posicionamento comum aos cinco juristas, a competência não dos Estados, como prevê o relatório, mas sim da União de legislar sobre as florestas trouxe polêmica à discussão. Entre os presentes, o ex-ministro da Defesa Nelson Jobim não falou sobre meio ambiente, segundo ele “por não entender a fundo o assunto”, mas deu um banho de conhecimento nos senadores ao se posicionar contrário à competência dos Estados defendida no relatório do senador Luiz Henrique.
“O Senado não pode induzir a concorrência predatória entre os Estados. A norma geral está diretamente vinculada à conseqüência econômica e vocês não podem fazer vista grossa para isso”, afirmou. “Alguns senadores querem marcar posição. Outros querem criar soluções. Esses vão fazer a diferença. Essa é a responsabilidade dos senhores e não a defesa de determinados setores e interesses”.
Duro, Jobim defendeu que a legislação preze pela uniformidade nacional e assim evite o conflito estadual. “Não transfiram para o poder executivo ou para o juiz o que vocês podem resolver aqui. Isso é dar a segurança jurídica que a sociedade precisa”.
Esse também foi o tom utilizado pelo doutor Honoris Causa em Direito Ambiental pela Unesp, Paulo Afonso Machado, ao dizer que "somente no caso de não existir a norma geral é que o Estado poderia ter como legislar em suas particularidades". Ao final de sua apresentação, Paulo Afonso ainda atacou pontos do texto que anistiam desmatamentos ilegais e permitem o aumento das derrubadas de florestas, principalmente nas APPs: "As APPs existem para a busca do equlíbrio, não são invenção da lei. Devem ser protegidas porque são protetoras das águas e do solo. Eliminar APP é abrir as portas para o deserto. Quem destroi APP é um fabricante de seca".
As falhas desse texto se acumulam de uma forma tão óbvia que, após a fala dos convidados, só restou à senadora Katia Abreu (sem partido), ferrenha defensora do texto, vociferar contra os convidados, numa atitude que fez o senador Pedro Taques (PDT-MT) chamar-lhe a atenção sobre a descompostura. Ela chegou a apresentar sua fala como presidente da CNA (Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária), em vez de representante do povo - como deveria se portar dentro do Senado.
Aprovado após votação tumultuada em maio no plenário da Câmara, a proposta está em discussão no Senado e aguarda, na Comissão de Constituição e Justiça do Senado, votação do relatório feito pelo senador Luiz Henrique (PMDB-SC).
Apresentado oficialmente aos senadores na sessão do dia 31 de agosto, o texto deveria se ater apenas a analisar a constitucionalidade do tema, já que o mérito da questão deve ser discutido nas demais comissões por onde o projeto de lei passa. Porém, o senador, além de ignorar este fato e fazer alterações no conteúdo do texto, preferiu também não levar em conta as análises e contribuições dadas pelos convidados do Senado para a audiência de hoje, visto que seu relatório foi apresentado e lido na comissão há duas semanas.
A votação do relatório poderá acontecer já a partir de amanhã, dia 14 de setembro.
Fonte;Greenpeace
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