A volatilidade do valor do barril não altera uma certeza: as energias
renováveis seguirão em alta. E o Brasil não pode mais perder tempo
Parque Eólico de Aracati, no Ceará. ©Greenpeace/Otávio Almeida
Juntas, as fontes solar e eólica viram sua capacidade instalada crescer cerca 1.000% no mundo ao longo da última década. Felizmente, há plenas condições para esse ciclo virtuoso continuar, e diversas razões para isso podem ser destacadas.
Na maioria dos países, as novas energias renováveis ainda crescem sem competir tão diretamente com o petróleo. Enquanto mais de metade do petróleo produzido no mundo é consumido como combustível para os transportes e outra grande fatia vai para atividades industriais, as novas renováveis ganham espaço com mais força na geração de eletricidade –na qual a competição central é com carvão, gás natural e energia nuclear. O preço de petróleo pode até exercer alguma influência, mas não é determinante.
Com o avanço das tecnologias, é esperado que as novas renováveis passem a competir mais diretamente com o petróleo. Os veículos elétricos, que ainda não ganharam grande escala mas devem fazê-lo em alguns anos, são um exemplo. Contudo, a redução de preços das fontes mais modernas de energia também tem sido notável: desde a década de 1980, o custo de painéis solares vem caindo cerca de 10% ao ano. E deve seguir nessa tendência, segundo estudo de pesquisadores da Universidade de Oxford publicado neste ano.
É importante ressaltar que, enquanto os preços das renováveis só tendem a cair, a história nos mostra que o preço do petróleo é oscilante, sendo muito difícil dizer em qual patamar estará daqui a poucos anos ou até mesmo meses. Investir em petróleo, portanto, é um negócio arriscado. Mas apostar nas novas renováveis é uma estratégia cada vez mais segura, especialmente no longo prazo, que é para onde governos e empresas do setor geralmente olham.
Outra razão para manter o otimismo com relação às novas renováveis é a consolidação do setor. Seu crescimento na última década superou as expectativas mais otimistas. Uma das principais barreiras à popularização das energias solar e eólica, o armazenamento de energia em baterias compactas para momentos em que o sol não brilha ou o vento não sopra, já está sendo superada por produtos lançados recentemente.
Além disso, a previsibilidade dessas fontes de energia vem sendo estudada e equacionada há muito tempo, e é uma área de conhecimento avançada. Para citar um exemplo, em 2014, temia-se o risco de um eclipse desestabilizar a rede elétrica da Alemanha, que conta com participação significativa de energia solar. O impacto, no entanto, foi mínimo e pontual, reforçando a confiança na matriz.
Fim da era do petróleo
Para além de aspectos econômicos e técnicos, as esferas política e socioambiental da discussão também apontam cada vez mais na direção de energias como a solar e a eólica. A nível global, as renováveis são a principal saída para o desafio das mudanças climáticas, causadas principalmente pela queima de combustíveis fósseis como o petróleo.
No final do ano passado, governos de 195 países assinaram o importante Acordo de Paris, assumindo os compromissos de evitar um aquecimento global superior a 1,5°C e, na segunda metade do século, neutralizar emissões de gases de efeito estufa. Em termos práticos, a única forma realista de atingir esses objetivos é zerando o consumo de combustíveis fósseis até 2050. Ou seja, o mundo já assinou o fim da era do petróleo.
Existe ainda espaço para governos aproveitarem os baixos preços do petróleo e removerem subsídios ao seu consumo. Com a drástica queda dos preços, esses subsídios simplesmente perdem sentido. Diversos países como Índia, Indonésia e Malásia já fizeram isso, e muitos outros podem seguir o exemplo.
Os recursos que iriam para as grandes empresas petrolíferas podem, então, ser direcionados justamente para as novas renováveis, acelerando a transição para uma matriz energética mais moderna e limpa. E se os preços do petróleo voltarem a subir, o mercado já estará operando sob novas condições. E se reequilibrará, sem contar com um apoio que custa caro à sociedade e perpetua o grave problema das mudanças climáticas.
Em resumo, o cenário continua notavelmente favorável às renováveis, e cada vez mais desfavorável para o petróleo. Não à toa o investimento em renováveis quebrou um novo recorde em 2015, chegando a US$ 329 bilhões, com China e Estados Unidos na liderança. Enquanto isso, cresce exponencialmente um movimento internacional de retirada de investimentos em petróleo, que já conta com o apoio de organizações como o Rockefeller Brothers Fund, a Universidade de Glasgow e o Conselho Mundial de Igrejas.
O Brasil tem tudo para se tornar um dos protagonistas dessa revolução energética. Poucos países contam com condições tão favoráveis às energias solar e eólica. Alguns de nossos governantes já começam a perceber isso. Um deles é José Fortunati, prefeito de Porto Alegre, que há menos de um mês assumiu o compromisso de ter 100% dos prédios municipais gerando ou consumindo energias limpas e renováveis até 2050.
Ainda assim o governo federal continua olhando para o passado. E destinará aos combustíveis fósseis cerca de 70% dos investimentos públicos em energia previstos para a próxima década. Outro exemplo dos equívocos cometidos é o fato da presidente Dilma ter vetado uma séria de medidas favoráveis às energias renováveis no Plano Plurianual para 2016-2019, sancionado há poucas semanas.
Está totalmente ao alcance de Dilma e sua equipe mudar de postura e investir de fato no futuro. Basta abrir os olhos para os enormes benefícios econômicos, sociais e ambientais oferecidos pelas renováveis.
(Pedro Telles é coordenador de Clima e Energia do Greenpeace. Esse artigo foi originalmente publicado no site UOL Notícias.)
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