Sunday, June 5, 2016

Nove motivos para NÃO comemorar o Dia do Meio Ambiente

E dois para não perder a esperança na humanidade 
 
É inegável que a questão ambiental vem ganhando cada vez mais espaço nos debates globais sobre economia, direitos humanos e desenvolvimento. Mas ainda não é suficiente. E nada melhor que o Dia do Meio Ambiente para fazer o que sabemos melhor: reforçar a necessidade de medidas ambiciosas e concretas em favor da questão ambiental. Somos chatos mesmo. Mas pense bem: se não pegarmos no pé, é só politicagem, fica no discurso.
Por isso listamos nove motivos para NÃO comemorar o Dia do Meio Ambiente. Afinal, se dependermos de promessas e falsas soluções, estamos perdidos.

1) Sustentabilidade brasileira para inglês ver
O Brasil é visto internacionalmente como um modelo a ser seguido no quesito desenvolvimento sustentável. FUEEIN, ERRADO! Embora perante a Cúpula do Clima da Organização das Nações Unidas tentarmos vender a imagem de referência na proteção das florestas, energias renováveis e controle de emissão de gases, a realidade é bem diferente. Cuidamos muito mal de nossas florestas. Continuamos desmatando a prazo, com prestações de 5 mil km2 ao ano só de Amazônia. No Cerrado são mais 6 mil km2. A madeira que sai da floresta é quase toda ilegal. Além disso o governo dá uma mãozinha na situação ao dizer que vai tolerar desmatamento ilegal na Amazônia por mais 15 anos – não, você não entendeu errado, é isso que tá no papel de promessas que o governo entregou prá ONU. Portanto, ao que parece, o governo está bem confortável com os números atuais de desmatamento. Já em energia, o status de investirmos em uma matriz  renovável também é totalmente controverso: as hidrelétricas causam impactos enormes e irreversíveis nos rios, na floresta, na fauna, na flora e na vida das populações dessas regiões. Enquanto isso, as verdadeiras renováveis, como solar, passam longe dos planos do governo.


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O desmatamento na Amazônia é de chocar. Grandes porções de terra, a perder de vista, são totalmente desmatadas para virar pasto de gado ou plantação.

2) Tá demorando uma CARa
Quando o professor passa lição de casa ou trabalho, se o aluno perde o prazo não tem segunda chance. É assim que aprendemos na escola, não? Bom, este ano o prazo para produtores rurais registrarem suas propriedades no Cadastro Ambiental Rural (CAR – rá, pegou?) foi prorrogado pelo SEGUNDO ano seguido. O registro é um RG da propriedade: traz informações e detalhes para entender o que acontece no terreno, sendo este um instrumento que auxilia no controle, por exemplo, do desmatamento. É exatamente por isso que grandes proprietários de terra protelam o cadastro: assim ficam invisíveis aos olhos do Estado, esperando pela próxima anistia de suas irregulares. No fim, dar mais tempo não vai resolver problema nenhum – ou, depois de dois anos, ainda dá pra acreditar que eles só não se cadastraram por falta de tempo?


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Grandes propriedades agropecuárias, como a da foto, não têm interesse em regularizar sua área.

3) Desmatamento desenfreado do Cerrado
Menos de 48% da vegetação original do Cerrado se encontra total ou parcialmente conservada, e, para piorar, o desmatamento vem aumentando em grande medida nos últimos anos, sendo maior até mesmo que o da Amazônia. A cada ano cerca de 6 mil km2 de Cerrado são destruídos por conta do avanço da agropecuária.


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Parque Estadual dos Pireneus em Goiás (© Creative Commons / Angela de Paula)

4) Esqueceram das Áreas Protegidas
Áreas Protegidas (AP) são a maneira mais eficiente de manter a floresta em pé. Ainda mais se forem Terras Índígenas, a modalidade de proteção comprovadamente mais eficiente contra o desmatamento. No entanto, nos últimos seis anos, quase nenhuma área foi criada e algumas, inclusive, foram reduzidas. Além disso, o quadro de governança das Unidades Conservação – outra modalidade de AP – é lastimável. Segundo auditoria do Tribunal de Contas da União (TCU), apenas 4% das Unidades de Conservação da Amazônia estão implementadas como deveriam.


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Com ajuda do Greenpeace, índios Ka'apor instalam monitoramento eletrônico em sua Terra Indígena para controle de invasões e desmatamento.

5) País que desrespeita suas origens
Os direitos indígenas, assegurados na Constituição Federal, nunca foram tão ameaçados pelos Três Poderes como atualmente. No Congresso tramita projetos que preveem desde a transferência aos parlamentares da demarcação de terras indígenas até mineração em suas terras e construção de hidrelétricas onde vivem povos indígenas inteiros. O Supremo Tribunal Federal (STF) determinou que para a terra ser do índio, lá ele deveria estar em 1988 (data da promulgação da Constituição Federal), sendo que muitos povos foram deslocados de suas terras na época da Ditadura Militar. E a cereja do bolo: o governo interino sinalizou que poderia revisar os decretos presidenciais emitidos a partir de 1º de abril deste ano, colocando 34 atos de Terras Indígenas sob risco de revogação.


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Líder do povo Munduruku. A etnia resiste contra a construção da hidrelétrica de São Luiz do Tapajós, que se for feita afetará cerca de 12 mil índios Munduruku.

6) Investimento massivo em energias fósseis
O Plano de Expansão Decenal de Energia, que prevê os rumos energéticos do país para a próxima década – até 2023 – é um enorme desastre: 70% dos investimentos serão destinados para energias fósseis! Para as renováveis como eólica, solar e biomassa, serão apenas 9,2% e, para os biocombustíveis, 6,5%. Entre 2009 e 2012, somente o setor elétrico aumentou suas emissões de gás de efeito estufa em cerca 500%.


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Usinas à carvão na Alemanha. Repare na quantidade de emissão de poluente.

7) Acordo de Paris
“Nossa, mas o que tem de errado aqui?” Ok, esse é um ponto não totalmente ruim. De fato é preciso reconhecer a importância do maior acordo global pela mitigação das mudanças climáticas. Mas também é preciso segurar a euforia e dizer que esse acordo tem velocidade de ação e conteúdos insuficientes. Para ser mais claro, enquanto o acordo prevê meta limite de aumento da temperatura entre 1,5ºC e 2ºC, as promessas entregues pelos países, caso realizadas em sua integridade, nos levariam à um mundo até 3,5ºC mais quente. Além disso, o nível global de CO2 já ultrapassou a marca de 400 ppm (parte por milhão) na atmosfera. O que isso significa? Que já temos muito mais gás que aquece o planeta sobre nossas cabeças do que deveria. Prova disso é que mês após mês batemos recordes de clima quente, e 2016 deve ser o ano mais quente da história. Temos que fazer mais, melhor e mais rápido.


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Poluição no ar de Nova Deli, na Índia.

8) Mariana (MG) e Licenciamento Ambiental
A maior tragédia ambiental da nossa história, causada pelo rompimento da barragem de rejeitos minerais da Samarco no dia 5 de novembro de 2105, avassalou municípios e famílias inteiras, além de tirar a vida do Rio Doce – deixando um rastro de 600km de destruição até o Oceano Atlântico. Quase seis meses depois, governo e as empresas fizeram um acordo onde todos se dão bem, menos as populações afetadas e a natureza. Uma vergonha, parabéns aos envolvidos!!! Além disso, parece que alguns políticos que convenientemente já se esqueceram dessa tragédia estão propondo o fim do Licenciamento Ambiental no Congresso Nacional.


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Vista do distrito de Bento Rodrigues, que foi completamente destruído pela força do mar de lama.

9) Passeio à Diesel
Tramita na Câmara dos Deputados um Projeto de Lei para permitir que carros de passeio também sejam movidos à diesel, uma das fontes de energia fóssil mais poluentes do planeta. E porque isso agora? Um dos motivos é que  as montadoras instaladas no país querem desovar aqui os motores de carros a diesel que já não conseguem vender em países que estão adotando medidas mais ambientalmente responsáveis, ou que precisam abaixar seu nível de poluição, que tem reflexos severos à saúde pública. Precisa falar mais?


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Nada melhor do que mostrar o rosto do deputado que quer aprovar um projeto de lei desse nível, não é? Pois é este cidadão aqui. Anote aí o nome dele: Deputado Aureo Lidio Moreira Ribeiro (SD/RJ) - (© Antonio Silva / Câmara dos Deputados)

Agora, para dar uma relaxada, DOIS motivos para não perder a fé na humanidade
1) Moratória da Soja
Ambição antiga do Greenpeace, hoje a Moratória da Soja é um dos instrumentos mais importantes no combate ao desmatamento pelo avanço da produção de soja. O acordo, que garante apenas a comercialização de soja plantada em áreas livre de desmatamento, foi renovado por tempo indeterminado em maio desse ano pelo Ministério do Meio Ambiente.


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À esquerda a ex-ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, assina a renovação por tempo indeterminado da Moratória da Soja.

2) Desmatamento Zero
A sociedade civil organizada apresentou no final do ano passado ao Congresso Nacional uma proposta de lei pelo fim do desmatamento nas florestas do País. O projeto conta com o apoio de ONGs, entidades religiosas, artistas e mais de 1,4 milhão de brasileiros – número exigido de assinaturas para poder ser aceito no parlamento. E a proposta não chegou apenas ao Congresso, mas também a grandes redes de supermercado: o Grupo Pão de Açúcar e o Walmart já assinaram o compromisso pelo Desmatamento Zero que garante o fornecimento de carne bovina livre de destruição ambiental e de violações de direitos humanos.


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Entrega do projeto de lei pelo Desmatamento Zero no Congresso foi uma festa. Na imagem, a artista Maria Paula mostra aos deputados a petição com mais de 1,4 milhão de assinaturas.

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