Tuesday, October 28, 2014

Investigação do Greenpeace motiva mudanças do outro lado do Atlântico

Depois da publicação da nova investigação do Greenpeace, que mostrou a madeira ilegal entrando nas serrarias e no mercado, o assunto entrou em pauta na Europa e em Israel. 

  
A serraria Odani, localizada em Placas, no Pará, está ligada a extração
e processamento de madeira ilegal. A empresa fornece para negociadoras
do mundo todo. (© Lunae Parracho/ Greenpeace). 

Após investigação do Greenpeace, que rastreou caminhões carregando madeira ilegal para dentro de serrarias em Santarém, no Pará, o mercado internacional começou a reagir. Esta é a segunda vez, apenas este ano, que o Greenpeace expôs as fraudes que tornam a cadeia produtiva de madeira do Brasil suja e ilegal.
Depois da publicação do relatório, empresas da Europa começaram a entender a gravidade do problema e a questionar o processo. A empresa holandesa Stiho, que trabalha com produtos de madeira, disse que irá parar imediatamente de comprar da empresa Rainbow Trading, uma das “lavanderias” de madeira ilegal exposta na investigação do Greenpeace.
A empresa exportadora Rainbow Trading recebeu madeira ilegal diretamente de um dos caminhões monitorados durante a investigação. Além disso, ela comprou madeira de uma serraria com a cadeia contaminada, a Comercial de Madeiras Odani. A Odani, também foi identificada na investigação do Greenpeace e foi a primeira a ser vistoriada, multada e a ter madeira apreendida pela SEMA (Secretaria de Estado de Meio Ambiente do Pará), que iniciou uma operação para apurar a denúncia.
Nos últimos sete anos a Rainbow Trading foi multada doze vezes pelo IBAMA e ainda soma mais de R$ 400 mil em multa não pagas. Ela afirma que a maior parte da madeira que recebeu este ano veio de 5 propriedades privadas com planos de manejo florestal aprovados. De acordo com análises de imagem de satélite, entretanto, em duas das propriedades indicadas não foi detectada exploração. Mesmo nas áreas onde foi observado traços de exploração, é fundamental que a SEMA vá a campo para averiguar a real exploração e cruza-la com a movimentação de créditos, já que a investigação do Greenpeace sugere que a documentação oficial desses planos está servindo apenas para esquentar madeira extraída ilegalmente de outro lugar.

Em um destes Planos de Manejo, por exemplo, houve uma enorme inflação de créditos no inventário florestal (i.e. relação das árvores a serem exploradas e seu respectivo volume, que é convertido em créditos), e isto referente apenas à espécie mais valiosa do mercado atualmente, o Ipê. A quantidade de créditos encontrada ultrapassa muito os padrões normais. Nesse mesmo plano, é impossível fazer a distribuição espacial das áreas de exploração, por conta de informações geográficas incompletas. Isto dificulta muito a vistoria e fiscalização, já que para chegar às árvores é necessário ter essa distribuição espacial exata. Este plano é um exemplo típico de fraude que acaba colocando muita madeira ilegal esquentada no mercado, e o pior, essas fraudes se passam facilmente por “erros técnicos”.
Europa deve fechar as portas para empresas como a Rainbow Trading
Desde o lançamento da primeira investigação, em maio deste ano, o Greenpeace vem alertando o mercado internacional sobre os problemas de se confiar na documentação oficial e, consequentemente, na origem madeira Amazônica brasileira, que deixa um rastro de violência e abre as portas para o desmatamento. Ainda assim, empresas como a Rainbow Trading continuam livres para fazer negócios com a Europa, por exemplo.
A União Europeia, desde março de 2013, impõe normas para coibir a importação de madeira e derivados considerados ilegais, por meio da regulamentação EUTR ou European Union Timber Regulation. O bloco econômico obriga todos os 28 Estados-Membros da UE a incorporem essas regras na constituição de cada país, que devem regulamentar a norma de acordo com a sua realidade.
Só este mês, vários carregamentos de madeira da Rainbow Trading foram entregues em Roterdã, com destino a Antuérpia. Um desses embarques chegou no dia 10 de outubro, outro na semana seguinte. E é provável que existam ainda mais embarques a caminho do continente.


Caminhão monitorado pelo Greenpeace trafega pela noite nas estradas
do Pará para burlar a fiscalização. (© Otávio Almeida/Greenpeace).

De acordo com a EUTR, no caso da impossibilidade de assegurar a total legalidade do produto, as empresas devem reduzir o risco de contaminação da sua cadeia deixando de adquirir a madeira. Se o produto vier de regiões não confiáveis, a madeira deve automaticamente ser considerada de alto risco ou ilegal.
Mas slgumas empresas continuam a rejeitar os resultados das investigações do Greenpeace e insistem em confiar na documentação oficial. Talvez, elas prefiram acreditar na declaração dada pela SEMA ao jornal britânico The Guardian, na semana passada, em relação à nossa investigação:  "Um novo sistema de licenciamento de registro e monitoramento para exploração madeireira será implementado durante o segundo semestre de 2015 ... de forma a coibir que empresas do setor florestal adquiram madeira proveniente de áreas que foram exploradas ilegalmente."
Ou talvez prefiram ainda a declaração do gerente da Serraria Odani, Adonias Leite, para a TV Globo, durante a operação que vem sendo realizada desde o lançamento do relatório: A madeira a gente recebe, mas não sabe dizer se eles tiraram do projeto ou de outro lugar, a gente não sabe. A gente não vai lá ver, disse o gerente.
“As empresas que compram madeira da Amazônia brasileira devem parar de se esconder atrás de documentos oficiais. Se não estão dispostas a assumir e levar a serio este desafio, devem então parar de comprar madeira proveniente desta região, já que ao consumir essa madeira assumem um risco alto demais.”, afirmou Marina Lacôrte, da Campanha Amazônia do Greenpeace.
O fato de a Rainbow Trading continuar inserindo madeira ilegal no mercado coloca em cheque a eficiência e o comprometimento quanto à norma europeia. Até quando as autoridades vão fechar os olhos para o problema, enquanto as mesmas empresas de sempre continuam a importar o produto ilegal das mesmas serrarias de sempre? As autoridades competentes dos países importadores precisam assumir urgentemente seu papel e fazer cumprir suas leis, penalizando efetivamente aqueles que não querem ou não conseguem aderir a elas.


Ação realizada nesta segunda-feira (27) pelo Greenpeace Israel em
frente a uma loja Home Center. (© Greenpeace).

As reações à campanha do Greenpeace vão além da Europa. Nesta segunda-feira um grupo de ativistas do Greenpeace estendeu faixas na entrada de uma das lojas da maior rede varejista de produtos para construção de Israel, a Home Center, com os dizeres “Chega de Madeira Ilegal”. De acordo com o Greenpeace de Israel, a empresa vinha comercializando Ipê amazônico, extraído no Pará, estado onde até 80% de todo o produto madeireiro é extraído de áreas consideradas ilegais, segundo o Imazon. Depois da ação, a empresa se comprometeu a se posicionar sobre o assunto.
Veja o site da campanha do Greenpeace Israel
E o Brasil? Vai fazer o que?
O governo brasileiro tem a obrigação de corrigir esse problema o quanto antes, e para isso deve realizar uma reforma profunda, não apenas no sistema eletrônico, mas em todo o sistema de controle, o que inclui a estrutura necessária para análise, vistoria, monitoramento e fiscalização destes planos. Um bom começo para as mudanças no sistema eletrônico seria a inserção imediata de filtros inteligentes que impeçam a inserção de dados suspeitos no sistema.
“O governo federal deve conduzir imediatamente a revisão de todos os planos de Manejo aprovados e ativos desde 2006. Nesse meio tempo, é claro, os governos estaduais responsáveis pela gestão florestal devem auditar essas futuras negociações uma a uma, ou parar imediatamente de emitir documentos oficiais que permitem “legalizar” a madeira ilegal, até que tenham a capacidade necessária pra regular a atividade por completo”, afirma Marina Lacôrte, da campanha Amazônia do Greenpeace.

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