Tuesday, September 22, 2015

Lá e aqui, hoje e sempre

Relembre a história dos ativistas do Greenpeace que foram presos por dois meses na Rússia após um protesto pacífico pela proteção do Ártico; medidas que criminalizam a liberdade de expressão são cada vez mais comuns, inclusive no Brasil 
 

Foto tirada no dia 19 de setembro de um celular mostra o momento em que a guarda costeira russa sobe ilegalmente e fortemente armada a bordo do Arctic Sunrise (foto: Greenpeace)

 O que você faria se fosse preso, mesmo sendo inocente? E se você fosse preso por tentar defender uma região do planeta que abriga um frágil e rico ecossistema, que desempenha importante papel no equilíbrio climático global, mas constantemente ameaçada pelo homem e por sua indústria? No dia 19 de setembro de 2013, 28 ativistas do Greenpeace e mais dois jornalistas freelancers começavam a maior provação de suas vidas – aquela que os tornaria conhecidos como “os 30 do Ártico”.
A ameaça
A Gazprom, empresa russa de petróleo, estava operando no Ártico e os ativistas decidiram protestar de forma pacífica contra a plataforma de petróleo da companhia. Dois deles tentaram escalar a lateral da embarcação para estender um banner destacando os riscos da exploração, mas foram presos.
No dia seguinte, em uma operação que parecia de filme, a força policial da Rússia desceu  no Arctic Sunrise, navio do Greenpeace, direto de um helicóptero com armas em punho.


Os ocupantes do navio foram presos, levados para a cidade russa de Murmansk e acusados de pirataria e de vandalismo, o que que poderia lhes render até 15 anos de prisão. Denis Sinyakov, um dos fotógrafos acusados, disse na época: "O crime pelo qual estou sendo acusado tem nome: jornalismo. E vou continuar praticando".
Os ativistas só foram soltos depois de dois meses e anistiados após três. “Estou aliviada, mas não celebrando. Fui acusada e permaneci dois meses presa por um crime que não cometi, o que é um absurdo. Mas ainda penso em meus colegas russos que ficarão com a ficha suja em seu país por algo que eles não fizeram. Tudo isso porque eles lutaram pela proteção do Ártico”, declarou na época a ativista brasileira Ana Paula Maciel.
O Arctic Sunrise também foi apreendido para investigação e liberado somente em 27 de julho de 2014, tendo ficado todo esse tempo abandonado e sem os devidos cuidados em um canto isolado do porto de Murmansk, na Rússia. Quando o Greenpeace finalmente teve acesso ao navio, viu que ele não tinha condições mínimas de navegação, já que grande parte dos sistemas de comunicação, navegação e segurança foram quebrados ou removidos. Por meio de crowdfunding, a organização levantou o dinheiro necessário para os reparos e hoje o Arctic Sunrise continua sendo utilizado na luta pela defesa da região.
Justiça
Em março de 2014, os 30 do Ártico apresentaram uma queixa ao Tribunal Europeu de Direitos Humanos, pedindo indenização e uma declaração formal de que a apreensão e detenção do grupo foram ilegais. “Os 30 foram detidos em águas internacionais, em uma flagrante violação das leis russas e internacionais. Além disso, a reação das autoridades russas foi completamente extremada diante de um protesto pacífico. Os ativistas tentavam alertar ao mundo sobre os riscos que o Ártico corre com a exploração de petróleo”, afirmou Sergey Golubok, um dos advogados do grupo.

O grupo conhecido como os 30 do Ártico em São Petersburgo (©Dmitri Sharomov/Greenpeace)
 
No mês passado, o Tribunal Internacional de Viena, na Áustria, julgou o governo da Rússia culpado, baseado no desrespeito a diversos artigos da Convenção das Nações Unidas (ONU) sobre as Leis Marítimas. Agora a Rússia deve pagar uma compensação à Holanda, país onde o navio Arctic Sunrise do Greenpeace está registrado.
"É importante o reconhecimento de que estávamos fazendo um protesto pacífico e legal. Agora outros governos pensarão duas vezes antes de cometer um crime em nome da indústria do petróleo", comenta Thiago Almeida, da campanha Salve o Ártico do Greenpeace Brasil.
Tentarão nos calar lá e aqui, hoje e sempre
Assim como nossos ativistas, muitos outros, não só do Greenpeace, estão sendo presos pelo simples ato de se manifestar. Tornou-se estratégia de governos como o da Espanha e Índia criminalizar um direito básico do cidadão: a liberdade de expressão.
No Brasil não é diferente. Em 2013 o Greenpeace se uniu a outras organizações para barrar o Projeto de Lei 508/2013 que, caso fosse aprovado, garantiria que manifestantes pudessem ser punidos simplesmente por estarem em um protesto. Já a Lei 2016/15 , conhecida como “Lei Antiterrorismo”, foi aprovada pela Câmara dos Deputados no dia 13 de agosto de 2015, e transforma a depredação de bens públicos, que costuma ser feita em protestos populares, em terrorismo.
O episódio dos 30 do Ártico é um dos mais marcantes da história do Greenpeace e simboliza a vontade de mudar o mundo para melhor, não importa o custo. Porém, a luta – não só em defesa do meio ambiente, mas também pela liberdade de expressão e de se opor ao que não acreditamos – é diária e está longe do fim.

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